Informativo: 623 do STJ – Direito Penal
Resumo: O depositário judicial que vende os bens sob sua guarda não comete o crime de peculato.
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Ao considerar o que seja funcionário público para fins penais, nosso Código Penal nos dá um conceito unitário, sem atender aos ensinamentos do Direito Administrativo, tomando a expressão no sentido amplo. Dessa forma, para os efeitos penais, considera-se funcionário público não apenas o servidor legalmente investido em cargo público, mas também o que exerce emprego público, ou, de qualquer modo, uma função pública, ainda que de forma transitória, v.g., o jurado, os mesários eleitorais, etc.
Porém, não se pode confundir função pública com encargo público (munus publicum), hipótese esta não abrangida pela expressão “funcionário público”. Aliás, nesta esteira de raciocínio, temos a sempre atual lição de HungriaComentários ao Código Penal, v. 9, p. 402-403:
“É preciso, porém, não confundir função pública com múnus público. Assim não são exercentes de função pública os tutores ou curadores dativos, os inventariantes judiciais, os síndicos falimentares (estes últimos estão sujeitos a lei penal especial) etc.”.
O funcionário público é o sujeito ativo próprio do crime de peculato, que consiste, na forma básica do art. 312, caput, do Código Penal – que a doutrina chama de peculato próprio – na apropriação ou desvio de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo. O agente se apodera de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel que tem sob sua posse legítima, passando, arbitrariamente, a comportar-se como se dono fosse (uti dominus).
Com base na lição que diferencia o funcionário público de quem exerce apenas munus público, o STJ decidiu (HC 402.949/SP) que o depositário judicial que vende bens que estavam em seu poder não comete o crime de peculato. Considerou-se que o depositário não ocupa cargo, emprego ou função pública, não recebe salário e não tem nenhuma espécie de vínculo estatutário com o poder público:
“1 – O crime de peculato exige para a sua consumação que o funcionário público se aproprie de dinheiro, valor ou outro bem móvel em virtude do “cargo”. 2 – Depositário judicial não é funcionário público para fins penais, porque não ocupa cargo público, mas a ele é atribuído um munus, pelo juízo, em razão de bens que, litigiosos, ficam sob sua guarda e zelo”.
A ministra Maria Thereza de Assis Moura ressaltou, todavia, que a decisão se restringe a afastar do agente a qualidade de funcionário público, mas não impede que o Ministério Público apresente nova denúncia com a descrição fática e a capitulação adequadas à apropriação em tese cometida.
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