DECRETO DE 12 DE ABRIL DE 2017
Concede indulto especial e comutação de penas às mulheres presas que menciona, por ocasião do Dia das Mães, e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no exercício da competência privativa que lhe confere o art. 84, caput, inciso XII, da Constituição, com vistas à implementação de melhorias no sistema penitenciário brasileiro e à promoção de melhores condições de vida e da reinserção social às mulheres presas,
DECRETA:
(1) Prevê o Código Penal como causas extintivas da punibilidade a anistia, a graça e o indulto (art. 107, inc. II), formas de renúncia do Estado ao seu direito de punir. A LEP , revogando os dispositivos do CPP, disciplina seu procedimento.
(2) Na anistia o Estado, por meio de lei penal, devidamente discutida no Congresso Nacional e sancionada pelo executivo federal, por razões de clemência, política, social etc., esquece um fato criminoso, apagando seus efeitos penais (principais e secundários). Os efeitos extrapenais, no entanto, são mantidos, podendo a sentença condenatória definitiva ser executada no juízo cível, por exemplo.
Já a graça e o indulto, tratados em conjunto considerando as inúmeras semelhanças entre os dois institutos, são concedidos pelo Presidente da República, via decreto presidencial (art. 84, XII, CF/88 – ato administrativo), podendo ser delegada a atribuição aos Ministros de Estado, ao Procurador Geral da República ou ao Advogado Geral da União. Atingem apenas os efeitos executórios penais da condenação, subsistindo o crime, a condenação irrecorrível e seus efeitos secundários (penais e extrapenais).
(3) Anistia, graça e indulto e os crimes hediondos e equiparados – O inciso I do art. 2º da Lei 8.072/90 determina que os crimes hediondos e equiparados são insuscetíveis de anistia, graça e indulto.
Art. 1º O indulto especial será concedido às mulheres presas, nacionais ou estrangeiras, que, até o dia 14 de maio de 2017, atendam, de forma cumulativa, aos seguintes requisitos:
I – não estejam respondendo ou tenham sido condenadas pela prática de outro crime cometido mediante violência ou grave ameaça;
II – não tenham sido punidas com a prática de falta grave; e
III – se enquadrem, no mínimo, em uma das seguintes hipóteses:
a) mães condenadas à pena privativa de liberdade por crimes cometidos sem violência ou grave ameaça, que possuam filhos, nascidos ou não dentro do sistema penitenciário brasileiro, de até doze anos de idade ou de qualquer idade se pessoa com deficiência, nos termos da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 – Estatuto da Pessoa com Deficiência, que comprovadamente necessite de seus cuidados, desde que cumprido um sexto da pena;
b) avós condenadas à pena privativa de liberdade por crimes cometidos sem violência ou grave ameaça, que possuam netos de até doze anos de idade ou de qualquer idade se pessoa com deficiência que comprovadamente necessite de seus cuidados e esteja sob a sua responsabilidade, desde que cumprido um sexto da pena;
c) mulheres condenadas à pena privativa de liberdade por crimes cometidos sem violência ou grave ameaça, que tenham completado sessenta anos de idade ou que não tenham vinte e um anos completos, desde que cumprido um sexto da pena;
d) mulheres condenadas por crime praticado sem violência ou grave ameaça, que sejam consideradas pessoa com deficiência, nos termos do art. 2º do Estatuto da Pessoa com Deficiência;
e) gestantes cuja gravidez seja considerada de alto risco, condenadas à pena privativa de liberdade, desde que comprovada a condição por laudo médico emitido por profissional designado pelo juízo competente;
f) mulheres condenadas à pena privativa de liberdade não superior a oito anos, pela prática do crime previsto no art. 33 da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006, e a sentença houver reconhecido a primariedade da agente, os seus bons antecedentes, a não dedicação às atividades criminosas e a não integração de organização criminosa, tendo sido aplicado, em consequência, o redutor previsto no § 4o do referido artigo, desde que cumprido um sexto da pena;
g) mulheres condenadas à pena privativa de liberdade não superior a oito anos por crime praticado sem violência ou grave ameaça, desde que cumprido um quarto da pena, se não reincidentes; ou
h) mulheres condenadas à pena privativa de liberdade não superior a oito anos por crime praticado sem violência ou grave ameaça, desde que cumprido um terço da pena, se reincidentes.
(1) o indulto pode ser
a – pleno (quando extingue totalmente a pena) ou parcial (quando concede apenas diminuição da pena ou sua comutação). O artigo 1o do Decreto em comento anuncia o indulto pleno, enquanto o artigo 2o, o indulto parcial
b – incondicionado (quando a lei não impõe qualquer requisito para a sua concessão) ou condicionado (quando a lei impõe algum requisito). O artigo 1o do presente Decreto trabalha com indulto condicionado.
Vale ressaltar que o indulto extingue somente a pena, permanecendo os efeitos secundários (penais e extrapenais).
(2) O STF decidiu não ser possível computar, para o requisito temporal do indulto, o período de prova relativo ao “sursis”, pois, para o efeito extintivo da punibilidade, não se confunde o cumprimento parcial da pena (requisito objetivo do indulto) com o período em que a pena permaneceu suspensa (HC 123.698/PE, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe 26/11/2015).
(3) Estão abrangidas pelo benefício as condenadas por tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06). A Súmula 512 do STJA aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006 não afasta a hediondez do crime de tráfico de drogas. rotulava esse crime como equiparado à hediondo. Ocorre que, em 23/06/2016, julgando o habeas corpus 118.533/MS, relatado pela Min. Cármen Lúcia, o STF decidiu que o privilégio não se harmoniza com a hediondez do crime de tráfico, razão pela qual, uma vez aplicada a minorante, afasta-se o caráter hediondo do delito, ao qual se aplica pena restritiva de direitos. Em razão disso, o STJ cancelou a referida súmula.
Art. 2º A comutação da pena privativa de liberdade será concedida às mulheres, nacionais e estrangeiras, nas seguintes proporções:
I – em um quarto da pena, se reincidentes, quando se tratar de mulheres condenadas à sanção privativa de liberdade não superior a oito anos de reclusão por crime cometido sem violência ou grave ameaça, desde que cumprido um terço da pena até 14 de maio de 2017;
II – em dois terços, se não reincidentes, quando se tratar de mulheres condenadas por crime cometido sem violência ou grave ameaça e que tenham filho menor de dezesseis anos de idade ou de qualquer idade se considerado pessoa com deficiência ou portador de doença crônica grave e que necessite de seus cuidados, desde que cumprido um quinto da pena até 14 de maio de 2017; e
III – à metade, se reincidentes, quando se tratar de mulheres condenadas por crime cometido sem violência ou grave ameaça e que tenha filho menor de dezesseis anos de idade ou de qualquer idade se considerado pessoa com deficiência ou portador de doença crônica grave e que necessite de seus cuidados, desde que cumprido um quinto da pena até 14 de maio de 2017.
Parágrafo único. Caberá ao juiz competente ajustar a execução aos termos e aos limites deste Decreto, conforme o disposto no art. 192 da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 – Lei de Execução Penal, e proceder à conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos, quando cabível.
(1) Como já esclarecido nos comentários ao artigo anterior, o presente dispositivo anuncia a comutação de penas (indulto parcial).
(2) O Juiz da execução declarará extinta a pena ou ajustará a execução aos termos do decreto, no caso de comutação, efetuando-se novo cálculo de liquidação e retificando-se a guia de recolhimento.
(3) Apesar de ser ato discricionário do Presidente da República, a concessão do indulto não retira do Juiz o dever de analisar a sua legalidade/constitucionalidade, lembrando que o benefício está proibido em se tratando de delito hediondo ou equiparado (ar. 2º, inciso I da lei 8.072/90).
Art. 3º A autoridade que detiver a custódia das mulheres presas e os órgãos de execução previstos no art. 61 da Lei de Execução Penal, deverão encaminhar ao juízo competente, inclusive por meio digital, na forma estabelecida pela alínea “f” do inciso I do caput do art. 4º da Lei nº 12.714, de 14 de setembro de 2012, a lista daquelas que satisfaçam os requisitos necessários para a concessão dos benefícios previstos neste Decreto.
§ 1º O procedimento previsto no caput será iniciado de ofício, entretanto, admite-se que seja realizado mediante requerimento da parte interessada, de seu representante, de seu cônjuge ou companheiro, de ascendente ou descendente ou do médico que assista a mulher presa.
§ 2º O juízo da execução proferirá decisão para conceder ou não o benefício, ouvidos a defesa da beneficiária e o Ministério Público.
§ 3º Para o atender ao disposto neste Decreto, os Tribunais poderão organizar mutirões, desde que cumprido o prazo de noventa dias para análise dos pedidos formulados, que terão tramitação preferencial sobre outros incidentes comuns.
§ 4º Fica facultada ao juiz do processo de conhecimento a concessão dos benefícios contemplados neste Decreto nos casos em que a sentença condenatória tenha transitado em julgado para a acusação.
(1) Como bem observa Renato Marcão: “Não se tratando de indulto por provocação, e sim espontâneo, por iniciativa da autoridade concedente, o indulto coletivo dispensa a tramitação exigida para o indulto individual, que é provocado. Processa-se de forma singela, e, assim, se o sentenciado for beneficiário por indulto coletivo, o juiz, de ofício, a requerimento do interessado, do Ministério Público ou por iniciativa do Conselho Penitenciário ou da autoridade administrativa, providenciará seja anexada aos autos cópia do decreto, e declarará extinta a pena ou ajustará a execução aos termos do decreto, no caso de comutação” (Lei de Execução Penal Comentada, Ed. Saraiva, p. 357).
(2) Da decisão que defere ou indefere o indulto, cabe agravo em execução (art. 197 da LEP). Na falta de previsão legal, o STF se posicionou no sentido de o rito do agravo ser o mesmo do recurso em sentido estrito, prevendo, inclusive, o mesmo prazo de interposição: “É de cinco dias o prazo para interposição de agravo contra decisão do juiz da execução penal” (súmula 700).
ATENÇÃO: de acordo com o STF, o habeas corpus não é via adequada para requerer indulto (HC 72.233/4-SP).
(3) O agravo em execução tem efeito devolutivo (comum nos recursos) e regressivo ou juízo de retratação (presente no recurso em sentido estrito). Conforme se depreende da leitura do art. 197 da LEP, não possui efeito suspensivo, significa dizer que a decisão atacada por meio do recurso gera de imediato seus efeitos, não obstante a interposição da insurgência. Ocorre que há situações concretas em que a decisão, por gerar efeitos imediatos, acarreta inegável prejuízo, a exigir pronta intervenção da parte prejudicada, a fim de sustar seus efeitos antes do julgamento do agravo. Pode o MP impetrar mandado de segurança para conseguir efeito suspensivo em decisão que concedeu ilegalmente indulto para preso que não preenchia os requisitos?
Para o STJ, “O Ministério Público não tem legitimidade para impetrar mandado de segurança almejando atribuir efeito suspensivo ao recurso de agravo em execução, porquanto o órgão ministerial, em observância ao princípio constitucional do devido processo legal, não pode restringir o direito do acusado ou condenado além dos limites conferidos pela legislação, mormente se, nos termos do art. 197, da Lei de Execuções Penais, o agravo em execução não possui efeito suspensivo. Precedente do STJ” (HC 47.516-SP).
Então qual o instrumento a ser utilizado pelo MP?
Usando o CPC (art. 1019, I, do CPCArt. 1.019. Recebido o agravo de instrumento no tribunal e distribuído imediatamente, se não for o caso de aplicação do art. 932, incisos III e IV, o relator, no prazo de 5 (cinco) dias: I - poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão;), é possível que o relator do recurso confira a ele efeito suspensivo, de modo a suspender os efeitos da decisão até o pronunciamento definitivo do Tribunal, quando vislumbrar a possibilidade de resultar lesão grave e de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação.
Art. 4º Este Decreto entra em vigor na data da sua publicação.
O presente Decreto não se confunde com as habituais saídas temporárias do DIA DAS MÃES, benefício previsto no art. 122 da LEP. A saída temporária é cabível, dentre outras hipóteses, para o preso, no regime semiaberto, visitar a família e participar de atividades que concorram para o seu retorno ao convívio social. As presas que, eventualmente, não preencherem os requisitos do Decreto do Indulto, podem buscar, ainda, essa autorização de saída.
Para se aprofundar, recomendamos:
Livro: Lei de Execução Penal comentada
Curso: Carreira Jurídica (mód. I e II)
Curso: Intensivo para o Ministério Público e Magistratura Estaduais + Legislação Penal Especial