1. INTRODUÇÃO
Desde que a FGV passou a aplicar a prova, a revisão caiu uma única vez, no X Exame de Ordem. Embora de estrutura simples, a peça comporta uma porção de teses – falta de justa causa, nulidades e eventuais excessos na condenação. Portanto, se a FGV quiser, pode ser tão difícil quanto uma apelação. Além disso, há algumas peculiaridades que podem fazer com que a nota caia muito, caso não observadas. Falarei mais a respeito nas linhas a seguir.
2. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE EM REVISÃO
É possível alegar, em revisão, a falta de justa causa, nulidades e excessos na punição. E as causas de extinção da punibilidade? Reflita: se a punibilidade é extinta durante a execução penal, você faz o pedido de declaração ao juiz da execução. Se negado, deve ser interposto agravo em execução. No entanto, se a punibilidade é extinta após a execução, já não há mais o que pedir. Ex.: a execução da pena do condenado encerra em outubro de 2015. Em novembro do mesmo ano, surge lei nova que torna a conduta formalmente atípica (abolitio criminis). Neste caso, não há como pedir a extinção da punibilidade em revisão, afinal, na época da prática do delito e da execução da respectiva pena, a conduta era formalmente típica. Entretanto, imagine o seguinte: no enunciado da prova, a FGV traz tese de extinção da punibilidade e a peça é uma revisão. O que fazer? Peça a extinção da punibilidade. Na pior das hipóteses, se não estiver no gabarito, você não perderá ponto algum. O problema é se estiver e você não a alegar por não concordar pela possibilidade. A banca já deixou bem claro, em provas passadas, que não muda o gabarito, por mais absurdo que seja. Deixe os casos polêmicos para a sua atuação em tribunais. Da FGV, só queremos a vermelhinha.
3. FUNDAMENTO LEGAL
Art. 621 do CPP Art. 621. A revisão dos processos findos será admitida: I - quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos; II - quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos; III - quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena.. Não se esqueça de indicar o inciso. Se houver necessidade, cite mais de um inciso.
4. COMO IDENTIFICAR A PEÇA
O enunciado dirá que há sentença condenatória transitada em julgado, irrecorrível, e deixará bem claro que (art. 621): a sentença foi contrária à lei ou às evidências dos autos; a sentença foi baseada em depoimento, exame ou documento falso; após a sentença, surgiram novas provas de inocência do acusado ou de circunstância de determine ou autorize a diminuição da pena. Uma dica: se a FGV falar em justificação criminal, é um sinal de que a peça é realmente a revisão.
5. COMPETÊNCIA
A competência é do tribunal de onde partiu a sentença condenatória, ainda que não tenha havido recurso. Ex.: o réu é condenado pelo juiz da 1ª Vara Criminal de Juazeiro do Norte e não apela. Caso venha a ajuizar revisão, ela deverá ser endereçada ao TJ do Ceará. O mesmo acontece na JF. Se o réu é condenado na 1ª Vara Federal de Laguna, a revisão deve ser ajuizada no TRF da 4ª Região. Caso o STF tenha confirmado a sentença em grau de recurso ou tenha feito o julgamento em ação de competência originária, a revisão deve ser a ele endereçada. O mesmo raciocínio vale para o STJ, caso confirme a sentença em recurso.
6. LEGITIMIDADE
Além do próprio réu, a revisão pode ser ajuizada por “procurador legalmente habilitado ou, no caso de morte do réu, pelo cônjuge, ascendente, descendente ou irmão” (CPP, art. 623). Como não se admite revisão criminal pro societate, o MP e o querelante não podem ajuizar a peça.
7. PRAZO
Não existe. A partir do trânsito em julgado da sentença condenatória até a eternidade, antes ou após a extinção da pena, mesmo que já morto o condenado.
8. TESES
Você deve ter como norte aquelas hipóteses do art. 621 do CPP. Tendo isso em mente, busque as teses absolutórias do art. 386 do CPPArt. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: I - estar provada a inexistência do fato; II - não haver prova da existência do fato; III - não constituir o fato infração penal; IV – estar provado que o réu não concorreu para a infração penal; V – não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal; VI – existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena (arts. 20, 21, 22, 23, 26 e § 1o do art. 28, todos do Código Penal), ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência; VII – não existir prova suficiente para a condenação. , por falta de justa causa, nulidades processuais e circunstâncias que possam diminuir a pena do condenado – incluída, aqui, a desclassificação.
9. REVISÃO CRIMINAL NO JÚRI
Transcrevo o que disse Renato BrasileiroManual de Direito Processual Penal, 2016 sobre o assunto: “Prevalece na doutrina e na jurisprudência o entendimento de que ao Tribunal de Justiça é conferida a possibilidade de, em sede de revisão criminal, proceder ao juízo rescindente e rescisório. Assim, se o Tribunal togado se convencer que a sentença condenatória se fundou em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos, pode, desde já, absolver o acusado, não havendo a necessidade de submetê-lo a novo julgamento perante o júri. Portanto, na ação autônoma de impugnação que é a revisão criminal, o tribunal de segundo grau tem competência tanto para o juízo rescindente, consistente em desconstituir a sentença do tribunal do júri, quanto para o juízo rescisório, consistente em substituir a decisão do júri por outra do próprio tribunal do segundo grau.”.
10. MODELO DE PEÇA
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO …
Obs.: fique atento à competência da JF.
FULANO, nacionalidade, estado civil, profissão, residente e domiciliado no endereço …., por seu advogado, que esta subscreve, com fundamento no art. 621, (inciso), do Código de Processo Penal, propõe REVISÃO CRIMINAL, pelas razões a seguir expostas:
Obs.: o julgador ainda não conhece o seu cliente. Por isso, você deve qualificá-lo, mas sem inventar dados – nada de “CPF 1234-5” ou “nacionalidade brasileira”, a não ser que o enunciado traga estas informações.
I. DOS FATOS
O revisionando foi condenado, em sentença transitada em julgado, pela prática do crime de furto (CP, art. 155Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.), à pena de de 2 (dois) anos de reclusão.
Ocorre que, logo após a conduta, e antes do recebimento da denúncia, por ato voluntário do agente, a res furtiva foi devolvida à vítima, mas a causa de diminuição do arrependimento posterior não incidiu sobre a condenação proferida pelo Exmo. Juiz da … Vara Criminal da Comarca ….
Ademais, o magistrado fixou a pena acima do mínimo legal sob o seguinte argumento: “a nossa cidade já não aguenta a ação desses criminosos. Trabalhamos duro, mas somos privados de nossos bens pela ganância daqueles que não lutam para ganhar o próprio pão. O ladrão é o mais torpe dos bandidos, pois toma do justo o que lhe é de direito”.
Obs.: a dica de sempre: no tópico dos fatos, apenas resuma o enunciado.
II. DO DIREITO
Portanto, Excelências, é imperiosa a reforma da sentença condenatória imposta ao revisionando, com fundamento no art. 626 do Código de Processo PenalArt. 626. Julgando procedente a revisão, o tribunal poderá alterar a classificação da infração, absolver o réu, modificar a pena ou anular o processo. Parágrafo único. De qualquer maneira, não poderá ser agravada a pena imposta pela decisão revista..
Como está demonstrado nos autos, antes do recebimento da denúncia, o bem subtraído foi devolvido à vítima por ato voluntário do agente, que, ao assim agir, passou a fazer jus à causa de diminuição do arrependimento posterior, do art. 16 do Código Penal Art. 16 - Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente, a pena será reduzida de um a dois terços. .
Além disso, o juiz fixou a pena acima do mínimo legal com base em argumentos não jurídicos, populistas, em detrimento ao art. 59 do Código PenalArt. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: I - as penas aplicáveis dentre as cominadas; II - a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos; III - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade; IV - a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível., devendo a pena ser fixada no mínimo legal.
Obs.: o art. 626 será, sem dúvida alguma, pedido no gabarito. Por isso, cite-o em mais de uma oportunidade, sempre que estiver sustentando as teses. Ademais, fique esperto: se o enunciado falar em “justificação criminal”, faça menção a ela para fundamentar a sua tese no tópico “do direito”. É bem provável que a FGV traga algum quesito nesse sentido.
III. DO PEDIDO
Diante do exposto, requer, com fundamento no art. 626 do CPP, seja julgada procedente a revisão criminal, para que incida sobre a condenação do revisionando a causa de diminuição do arrependimento posterior, do art. 16 do CP, e para que a pena seja fixada no mínimo legal, com fundamento no art. 59 do CP.
Obs.: no tópico “do pedido”, traga o art. 626. Além disso, não economize em fundamentação: traga os artigos do tópico “do direito” para o “do pedido”. Por fim, não se esqueça de fazer a análise do art. 630 do CPPArt. 630. O tribunal, se o interessado o requerer, poderá reconhecer o direito a uma justa indenização pelos prejuízos sofridos. § 1º Por essa indenização, que será liquidada no juízo cível, responderá a União, se a condenação tiver sido proferida pela justiça do Distrito Federal ou de Território, ou o Estado, se o tiver sido pela respectiva justiça. § 2º A indenização não será devida: a) se o erro ou a injustiça da condenação proceder de ato ou falta imputável ao próprio impetrante, como a confissão ou a ocultação de prova em seu poder; b) se a acusação houver sido meramente privada.. Se for possível, peça a fixação de indenização.
Pede deferimento.
Comarca, data.
Advogado.