A internet, sem dúvida, representa uma importante ferramenta à disposição do consumidor. Sinal disso são os dados recentemente divulgados, os quais dão conta de que no primeiro semestre desse ano o comércio eletrônico faturou R$18,6 bilhões. Ou seja, as compras pela internet caíram no gosto do consumidor brasileiro.
Entretanto, não é só para adquirir bens que o consumidor tem utilizado a internet. Se utiliza para comprar, também tem utilizado para reclamar da (má) qualidade de produtos e serviços e do atendimento dispensado pelos fornecedores na solução de demandas de consumo.
Até aí, nada demais, a não ser por um detalhe: há consumidores que, segundo o Judiciário, estão abusando do direito de reclamar, fato que tem levado as sociedades empresárias a ajuizar ações reparatórias, de modo a buscar compensação pelo dano moral que sofrem quando o consumidor se excede no direito de reclamar, e assim acabam maculando a imagem dos fornecedores.
Nesse contexto, é bom esclarecer que o Código de Defesa do Consumidor é, sim, uma importante arma a favor do consumidor na defesa de seus direitos. É um diploma altamente protecionista, e seu próprio nome revela que seu objetivo é proteger exatamente o sujeito vulnerável da relação de consumo – o consumidor.
Contudo, o CDC jamais pode ser visto pelo consumidor como uma arma de poderes ilimitados. A esse respeito, perceba-se que o art. 4º, III, do CDC Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: (...) III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;, prevê, expressamente, que os interesses dos participantes da relação de consumo, isto é, consumidor e fornecedor, devem ser harmonizados. Isso significa que não só o consumidor possui interesses legítimos, mas também o fornecedor. Ou seja, a relação de consumo deve ser equilibrada, devendo as partes agirem sempre com boa-fé, ainda conforme o dispositivo citado.
Nessa ordem de ideias, ao consumidor deve ser esclarecido que o fornecedor (geralmente uma pessoa jurídica), também pode sofrer dano moral. É o que enuncia a súmula nº 227 do Superior Tribunal de Justiça. Veja-se:
Súmula 227 – A pessoa jurídica pode sofrer dano moral.
Registre-se que a pessoa jurídica, apesar de não possuir honra subjetiva, como a pessoa natural, possui honra objetiva, que é, resumidamente, a sua imagem perante a sociedade.
Com vistas nesse fato é que o consumidor, no momento em que for exercer o legítimo direito de reclamar, deve tomar cuidado para não se exceder, pois o modelo de responsabilidade civil adotado pelo legislador brasileiro também prevê punição pelo abuso de direito, figura prevista no art. 187 do Código Civil, assim redigido:
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
Numa palavra final: as reclamações levadas a efeito pelo consumidor desempenham o importante papel de estimular o fornecedor a melhorar a qualidade de seus produtos e serviços; melhora-se o mercado de consumo para ambas as partes. Ganha o consumidor, que passa a contar com bens de consumo melhores, e também ganha o fornecedor, que, ofertando produtos e serviços melhores, conquista o consumidor, que acaba se fidelizando. O que não se pode admitir é que, num sistema que objetiva o equilíbrio entre esses dois sujeitos da relação de consumo, o consumidor aja abusivamente, buscando aniquilar a imagem do fornecedor perante a sociedade. Desse modo, ambos saem perdendo, pois o consumidor, apesar da reclamação abusiva, muitas vezes não tem seu problema efetivamente solucionado, o que, em última análise, é o que realmente lhe interessa. De seu turno, o fornecedor, talvez por causa de um deslize, tem sua imagem tão maculada, que acaba perdendo clientela. Ou seja, todos saem perdendo.