O parágrafo único do art. 355 do CP pune, com as mesmas penas do caput, o advogado ou procurador judicial que defende na mesma causa, simultânea ou sucessivamente, partes contrárias.
O dispositivo traz, portanto, duas formas de infidelidade profissional. Na primeira – patrocínio simultâneo – o advogado ou procurador, concomitantemente, zela (ainda que por interposta pessoa) os interesses de partes contrárias; na segunda – patrocínio sucessivo (ou tergiversação) – o causídico renuncia ao mandato de uma parte (ou por ela é dispensado) e passa, em seguida, a representar a outra.
Há alguns dias, a Sexta Turma do STJ deu provimento a recurso especial para restabelecer sentença de absolvição sumária em processo no qual um advogado estava sendo acusado de patrocínio simultâneo (REsp 1.722.255/SP, j. 04/09/2018) porque, ao mesmo tempo em que atuava como procurador do município num processo de falência de determinada empresa, representou outra empresa, no mesmo processo, em ato relativo à arrematação judicial de imóvel pertencente à massa falida.
Embora a primeira instância tenha absolvido sumariamente o procurador, o Tribunal de Justiça de São Paulo determinou o prosseguimento da ação penal considerando que o crime tem natureza formal, o que dispensa a comprovação de dano.
De fato, o crime de patrocínio simultâneo é formal, dispensa a ocorrência de prejuízo aos representados, pois sua tipificação é baseada sobretudo na violação ética que por si abala a administração da justiça. Ocorre, no entanto, que não é disso que se trata no caso julgado.
A exemplo da primeira instância, o STJ considerou que a situação na qual se baseou o Ministério Público para oferecer denúncia não caracteriza patrocínio simultâneo, pois a empresa que pretendia fazer a arrematação do imóvel pertencente à massa falida não pode ser considerada parte adversa do município do qual o agente era também procurador. Ao contrário, era interesse do município, na qualidade de credor da massa, que o bem fosse alienado:
“Como o recorrente apenas apresentou proposta de arrematação de bem imóvel da massa falida em nome da empresa Jovi Empreendimentos Imobiliários, não se pode falar em conflito de interesses, porquanto tal providência, na realidade, favorece os credores da massa falida, entre eles o município de Ferraz de Vasconcelos; não visualizo, em momento algum, a atuação contra os interesses do município, que, repito, como parte credora, objetiva receber os valores devidos pela empresa falida”.
Ainda segundo a decisão, o conflito só se caracterizaria se a empresa representada pelo advogado fosse, tal como o município, credora da massa falida. E nem mesmo o fato de que o bem poderia ser arrematado por valor maior do que o proposto pela empresa é capaz de justificar a existência do conflito de interesses.
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