1) Na hipótese de homicídio praticado na direção de veículo automotor, havendo elementos nos autos indicativos de que o condutor agiu, possivelmente, com dolo eventual, o julgamento acerca da ocorrência deste ou da culpa consciente compete ao Tribunal do Júri, na qualidade de juiz natural da causa.
O homicídio culposo na direção de veículo automotor é tipificado no art. 302 do Código de Trânsito. O caput trata da forma básica, o § 1º elenca quatro majorantes e o § 3º traz uma qualificadora para as situações em que o motorista pratica o crime ao dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência. O § 2º foi revogado pela Lei 13.281/16.
Embora a regra seja a punição deste homicídio na forma culposa, as circunstâncias do fato podem indicar o elemento subjetivo doloso, especificamente aquele em que o motorista assume a possibilidade de provocar a morte de alguém ao adotar um comportamento de risco exacerbado na condução do veículo.
A embriaguez aliada ao homicídio na direção, antes da qualificadora inserida no § 3º do art. 302 pela Lei 13.546/17, era uma circunstância que muito comumente ensejava a imputação de homicídio com dolo eventual, porque neste caso há quem considere que o simples fato de o motorista assumir a direção sem condições físicas de exercer absoluto controle sobre o veículo evidencia a assunção do risco de provocar um acidente e de matar alguém.
Outra situação que quase sempre ensejava a imputação de homicídio doloso era a morte provocada durante competição ilegal em via pública. Neste caso, até com mais ênfase do que em relação à embriaguez, sustenta-se que a prática de manobras arriscadas e as altíssimas velocidades impostas pelos motoristas indicam irresponsabilidade e aceitação do risco de matar.
Tanto no caso da embriaguez quanto no da competição ilegal houve certas mudanças a partir da entrada em vigor das Leis 13.546/17 e 12.971/14, que alteraram, respectivamente, os artigos 302 e 308 do Código de Trânsito. No primeiro, como já adiantamos linhas acima, a prática do homicídio na direção de veículo automotor é qualificada se o motorista está embriagado, como estabelece o § 3º; no segundo, se da competição ilegal decorre a morte de alguém, qualifica-se o delito. É o que dispõe o § 2º, que, aliás, ressalva sua incidência desde que as circunstâncias demonstrem “que o agente não quis o resultado nem assumiu o risco de produzi-lo”.
Em resumo, modificou-se a forma como a imputação do dolo eventual é avaliada. Antes, eram raros os casos em que se imputava homicídio culposo em ambas as situações. Concluía-se imediatamente pelo dolo eventual. Atualmente isto não é mais possível, pois as qualificadoras inseridas pelas novas leis impõem a regra de que, em um caso como no outro, o homicídio seja a priori tratado na forma culposa.
Mas isto não quer dizer que se afasta absolutamente a possibilidade de imputar o dolo eventual. O próprio § 2º do art. 308 ressalva que a qualificadora não se aplica se houver elementos do dolo direto ou do dolo eventual. E, mesmo que o § 3º do art. 302 não faça a mesma ressalva a respeito da embriaguez, nada impede que a análise continue sendo feita no caso concreto, que, eventualmente, pode atrair a imputação do dolo.
Os efeitos da atribuição do dolo ou da culpa não se limitam à severidade da pena, estendem-se à competência de julgamento, pois, enquanto o homicídio culposo é julgado pelo juiz singular, o doloso é julgado pelo Tribunal do Júri.
Ocorre que, evidentemente, ninguém a quem se imputa um homicídio com dolo eventual se conforma em ser processado nesses termos e correr o risco de sofrer uma pena muito mais severa do que a correspondente à figura culposa, e este inconformismo já se manifesta durante a primeira fase do procedimento do júri, quando se busca a desclassificação do crime.
Não se impede de forma absoluta que, ao analisar a prova produzida até aquele momento, o juiz conclua pela inexistência de dolo e promova a desclassificação do crime para a modalidade culposa. Mas isto só pode ser feito se a prova for evidente, se não houver dúvida de que a conduta não foi animada pelo dolo, pois, havendo indicações, ainda que mínimas, de que o acusado agiu ao menos assumindo o risco de provocar a morte o juiz deve pronunciá-lo para que a desclassificação seja submetida à análise do Tribunal do Júri.
É neste contexto que surge a tese do STJ:
“Afirmar se o agente agiu com dolo eventual ou culpa consciente é tarefa que deve ser analisada pelo Tribunal do Júri, juiz natural da causa, de acordo com a narrativa dos fatos constantes da denúncia e com o auxílio do conjunto fático-probatório produzido no âmbito do devido processo legal, o que impede a análise do elemento subjetivo de sua conduta por este Sodalício. Precedentes.” (HC 472.380/TO, j. 07/05/2019)
2) O fato de a infração ao art. 302 do Código de Trânsito Brasileiro – CTB ter sido praticada por motorista profissional não conduz à substituição da pena acessória de suspensão do direito de dirigir por outra reprimenda, pois é justamente de tal categoria que se espera maior cuidado e responsabilidade no trânsito.
O art. 302 do Código de Trânsito comina ao autor de homicídio culposo na direção de veículo automotor as penas de detenção (ou reclusão, na forma qualificada do § 3º) e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.
Há quem argumente que a imposição de limitação ao direito de dirigir não pode atingir o motorista profissional que, por imprudência, negligência ou imperícia, tenha matado alguém na direção de seu veículo. Isto porque, tratando-se do meio pelo qual este indivíduo exerce sua profissão e sustenta a si e à sua família, impedi-lo de dirigir equivale a provocar privações que escapam à finalidade da pena.
Mas a orientação majoritária se firmou no sentido de que a limitação não só é possível como é crucial para retirar de circulação motoristas que, exatamente pela profissão, deveriam adotar condutas com nível de prudência mais elevado do que a média dos demais:
“De acordo com a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, os motoristas profissionais – mais do que qualquer outra categoria de pessoas – revelam maior reprovabilidade ao praticarem delito de trânsito, merecendo, pois, a reprimenda de suspensão do direito de dirigir, expressamente prevista no art. 302 do CTB, de aplicação cumulativa com a pena privativa de liberdade. Dada a especialização, deles é de se esperar maior acuidade no trânsito.” (AgRg no REsp 1.771.437/CE, j. 11/06/2019)
3) A imposição da penalidade de suspensão do direito de dirigir veículo automotor não tem o condão, por si só, de caracterizar ofensa ou ameaça à liberdade de locomoção do paciente, razão pela qual não é cabível o manejo do habeas corpus.
Como dispõe o art. 292 do Código de Trânsito, “A suspensão ou a proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor pode ser imposta isolada ou cumulativamente com outras penalidades”.
Há determinados crimes cujo preceito secundário já cumula esta pena à privativa de liberdade, como o homicídio culposo, a lesão corporal culposa, a direção sob influência de álcool ou substância de efeitos análogos e a competição ilegal em via pública. Segundo o art. 293, o prazo da limitação ao direito de dirigir varia de dois meses a cinco anos, conforme as circunstâncias do crime cometido.
É possível que o condenado questione a razoabilidade e a proporcionalidade do prazo da medida imposta, tanto quanto normalmente se faz sobre a aplicação da pena, cuja análise se faz sob a influência de diversas circunstâncias que podem ser encaradas de formas diversas a depender do magistrado. Mas, segundo tem decidido o STJ, não é possível questionar o prazo da limitação do direito de dirigir por meio de habeas corpus, pois a medida não impõe nenhuma limitação do direito de ir e vir, nem pode ser convertida em privação da liberdade caso seja descumprida:
“A medida administrativa de suspensão do direito de dirigir não pode ser objeto de conhecimento pela via do habeas corpus. Isto porque a ação mandamental tem seu alcance delimitado pelo art. 5º, inciso LXVIII, da Constituição Federal, que afirma ser cabível o habeas corpus “sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”.
(…)
Assim, configura requisito inafastável para a ação de habeas corpus a existência de qualquer indício de ameaça de violência ou constrangimento à liberdade de ir e vir do paciente, não se conhecendo do writ nos casos em que tal pressuposto não for observado.
Na hipótese em tela, verifica-se que a medida administrativa de suspensão do direito de dirigir veículo automotor, bem como a imposição de penalidades administrativas que também restringem o exercício de tal direito pelo motorista, não acarretam qualquer risco à sua liberdade de locomoção, uma vez que, caso descumpridas, não podem ser convertidas em reprimenda privativa de liberdade, uma vez que inexiste qualquer previsão legal nesse sentido.” (AgRg no HC 443.003/RS, j. 21/08/2018)
4) Quando não reconhecida a autonomia de desígnios, o crime de lesão corporal culposa (art. 303 do CTB) absorve o delito de direção sem habilitação (art. 309 do CTB), funcionando este como causa de aumento de pena (art. 303, parágrafo único, do CTB).
O art. 303 do Código de Trânsito tipifica a lesão corporal culposa, que, segundo o § 1º, pode ter a pena aumentada de um terço à metade se o motorista não for habilitado para conduzir o veículo.
Ocorre que o Código de Trânsito tipifica de forma autônoma no art. 309 a conduta de dirigir veículo automotor, em via pública, sem habilitação e gerando perigo de dano. E, se o motorista não habilitado lesionou alguém, não só gerou como provocou o dano de que trata o tipo.
Em regra, quando o motorista não habilitado comete a lesão corporal, o crime autônomo do art. 309 não se tipifica, porque a falta de habilitação é uma causa de aumento de pena específica do crime de dano à integridade física:
“A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que o crime de lesão corporal culposa (art. 303 do CTB) absorve o delito de direção sem habilitação (art. 309 do CTB), funcionando este como causa de aumento de pena (art. 303, parágrafo único, do CTB). Destarte, extinta a punibilidade do agente em face da expressa renúncia da vítima ao direito de representação pelo delito de lesão corporal, também fica extinta a punibilidade com relação ao crime de direção sem habilitação, menos grave, porquanto absorvido. (HC 25.082/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, Quinta Turma, DJ 12/04/2004).” (HC 299.223/RJ, j. 24/05/2016)
Nada impede, no entanto, que as circunstâncias fáticas revelem condutas autônomas, que podem ensejar a imputação em concurso, assim como ocorre na relação entre o roubo e o porte de arma de fogo. De fato, a regra é de que o emprego de arma de fogo no roubo provoca o aumento da pena, mas não a imputação do delito autônomo relativo ao porte da arma, a não ser que o porte se revele destacado da conduta relativa à subtração, como no caso em que o assaltante é preso horas depois dos fatos com o artefato ainda em seu poder. Da mesma forma, vislumbra-se a possibilidade de imputar o crime decorrente da falta de habilitação se esta conduta se mostrar fora do contexto da lesão corporal.
Há no STJ ao menos uma decisão na qual se considerou que a ausência de representação da vítima da lesão corporal culposa impede a ação penal em relação a este crime, mas faz ressurgir o tipo autônomo da falta de habilitação, que deixa de funcionar como majorante:
“No caso em exame, o Tribunal de origem rechaçou o pleito de reconhecimento do princípio da consunção entre os delitos lesão corporal (art. 303 do CTB) e dirigir sem habilitação (art. 309 do CTB), não vislumbrando relação de exaurimento de conteúdo proibitivo da norma, nos seguinte termos: “[…] É verdade que a falta de habilitação, na hipótese de concurso com o crime de lesão corporal na condução de veículo automotor, passa a figurar como causa de aumento de pena, e não mais como delito autônomo. Mas, em sendo impossível a deflagração da ação penal pelo crime de lesões pela ausência de condição de procedibilidade, tal óbice decerto não se estende ao crime de falta de habilitação, que, assim, retoma a sua posição de delito autônomo. Observe-se que os delitos em questão visam à tutela de bens jurídicos distintos, sendo o crime do artigo 303 do Código de Trânsito Brasileiro voltado para a proteção da incolumidade física da vítima, enquanto o artigo 309 do mesmo Diploma Legal visa à segurança viária. Logo, não faz sentido que a vontade individual de uma única pessoa obste a persecução penal em favor de toda uma coletividade. Além disso, como bem destacado pela douta Procuradoria de Justiça, o acidente que deu origem à persecução criminal em exame não envolveu apenas o paciente e a vítima das lesões corporais, mas também um terceiro veículo, motivo pelo qual a propositura da ação penal era imperativa” (e-STJ fl. 77).” (RHC 61.464/RJ, j. 22/05/2018)
Parece-nos, todavia, que esta não é a melhor solução. A consunção se caracteriza pelo fato de que o crime previsto por uma norma (consumida) não passa de uma fase de realização do crime previsto por outra (consuntiva). É a esta aspecto que deve se limitar a análise da relação de absorção: se a falta de habilitação é considerada consumida pela lesão corporal, tanto que chega ao ponto de ser uma causa de aumento de pena, não pode ressurgir como delito autônomo somente porque não é possível perseguir a punição pelo crime que a havia consumido. Era esta a orientação adotada pelo STJ:
“Em razão do princípio da consunção, a lesão corporal culposa no trânsito (art. 303 do CTB) absorve o delito de dirigir sem habilitação (art. 309 do CTB), em face da menor lesividade do último. Assim, havendo a renúncia expressa ao direito de representação pelo crime de lesão corporal culposa, não pode a majorante, decorrente da ausência de habilitação, persistir como delito autônomo, devendo ser declarada extinta a punibilidade também do crime de dirigir sem habilitação. Precedentes desta Corte.” (HC 25.084/SP, j. 18/05/2004)
5) Os crimes de embriaguez ao volante (art. 306 do CTB) e o de lesão corporal culposa em direção de veículo automotor (art. 303 do CTB) são autônomos e o primeiro não é meio normal, nem fase de preparação ou de execução para o cometimento do segundo, não havendo falar em aplicação do princípio da consunção.
A Lei 13.546/17 inseriu no art. 303 do Código de Trânsito uma circunstância qualificadora relativa à lesão corporal culposa cometida por motorista embriagado. Segundo o disposto no § 2º daquele dispositivo, o motorista que estiver conduzindo veículo automotor sob a influência de álcool ou outra substância psicoativa que determine dependência, e, nessa condição, ferir alguém involuntariamente, será apenado com reclusão de dois a cinco anos, desde que a lesão seja de natureza grave ou gravíssima.
E se a lesão corporal for de natureza leve? Neste caso, não se aplica a qualificadora e a solução deve ser buscada considerando a possibilidade de concurso de delitos.
Sempre se debateu a respeito da melhor solução para a tipificação da conduta do motorista que, embriagado, cometesse lesão corporal culposa. Havia, basicamente, duas orientações: a relativa ao concurso de delitos e a que advogava a incidência do princípio da consunção. A controvérsia existente levou inclusive a alterações que, ora com o propósito de evitar o concurso de crimes, ora com o propósito de viabilizá-lo, introduziram e retiraram, nos artigos 302 e 303, causa de aumento de pena relativa à embriaguez.
Para a primeira corrente, como o crime de embriaguez tutela bem jurídico distinto e se consuma no momento mesmo em que o motorista embriagado se põe a conduzir o veículo pela via pública, este delito e a lesão corporal ocorrida em seguida, por meio de conduta – imprudente – autônoma, devem ser imputados em concurso material.
A segunda corrente afasta a possibilidade de concurso, em primeiro lugar, porque a imprudência se funda exatamente no fato de que o motorista conduz o veículo sem condições físicas em virtude da embriaguez. Em segundo lugar, porque, crime de dano, a lesão corporal deve absorver a embriaguez, caracterizada por ser um crime de perigo.
O STJ adota a orientação de que não pode haver relação de consunção entre a embriaguez e a lesão corporal culposa:
“Segundo o entendimento que prevalece nesta Corte Superior de Justiça, “os crimes de embriaguez ao volante e o de lesão corporal culposa em direção de veículo automotor são autônomos e o primeiro não é meio normal, nem fase de preparação ou execução para o cometimento do segundo, não havendo falar em aplicação do princípio da consunção. Precedentes.” (AgRg no REsp 1.688.517/MS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 07/12/2017, DJe 15/12/2017).” (AgRg no HC 442.850/MS, j. 25/09/2018)
Para o STJ, a conduta do agente que se embriaga, conduz o veículo pela via pública e acaba provocando um acidente no qual alguém é ferido não corresponde a nenhuma das situações características da consunção.
A orientação firmada, não obstante relativa a fatos ocorridos antes da modificação promovida pela Lei 13.546/17, continua válida, após a entrada em vigor da lei, para as situações em que o motorista embriagado pratica a lesão corporal culposa de natureza leve. Curioso é que, embora a soma das penas mínimas dos artigos 303, caput e 306 resulte na metade da pena mínima cominada no art. 303, § 2º (dois anos), a soma das máximas resulta em pena idêntica à da qualificadora (cinco anos).
6) O crime do art. 306 do CTB é de perigo abstrato, sendo despicienda a demonstração da efetiva potencialidade lesiva da conduta.
O crime é de perigo quando a consumação se contenta com a exposição do bem jurídico a uma situação de risco. Em determinadas situações, o legislador exige prova do risco ameaçando determinado bem jurídico, casos em que o crime é denominado de “perigo concreto”. No âmbito do trânsito, a direção sem habilitação (art. 309 do CTB) é um exemplo. Há também situações em que o perigo advindo da conduta é absolutamente presumido por lei, o que se denomina “crime de perigo abstrato”. O exemplo comumente citado é o tráfico de drogas, pois a conduta do traficante é crime independentemente de qualquer prova de efetivo dano à saúde pública.
No que concerne ao art. 306 do Código de Trânsito, havia certa controvérsia a respeito da natureza do perigo. Isto porque a redação original do art. 306 continha a expressão “expondo a dano potencial a incolumidade de outrem”. A fórmula era diferente daquela impressa no artigo 309, no qual da descrição da conduta nuclear se segue a expressão “gerando perigo de dano”. Neste último é fácil apreender que se trata de perigo concreto, mas, no primeiro, não necessariamente, porque, afinal, o dano potencial é o que fundamenta a própria existência do crime de perigo.
O STJ chegou a proferir decisões no sentido de que o crime do art. 306 é de perigo concreto:
“O delito de embriaguez ao volante previsto no art. 306 da Lei nº 9.503/97, por ser de perigo concreto, necessita, para a sua configuração, da demonstração da potencialidade lesiva. In casu, em momento algum restou claro em que consistiu o perigo, razão pela qual impõe-se a absolvição do réu-recorrente” (REsp n° 608.078/RS, j. 23/06/2004).
“O crime de embriaguez ao volante, definido no art. 306 do CTB, é de perigo concreto, necessitando, para sua caracterização, da demonstração do dano potencial o que, in casu, segundo a r. sentença e o v. acórdão ora recorrido, não aconteceu” (REsp n° 566.867/RS, j. 28/04/2004).
Ocorre que, em 2008, a Lei 11.705 (que ficou conhecida como “Lei Seca”) alterou a redação do art. 306, que deixou de conter a expressão relativa ao dano potencial. E, atualmente, com a redação dada pela Lei 12.760/12, o dispositivo tipifica a conduta da seguinte forma: “Conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência”.
Em razão disso, firmou-se a orientação de que se trata de crime de perigo abstrato, bastando que se demonstre a alteração da capacidade psicomotora em virtude da ingestão de álcool ou de substância psicoativa de efeitos semelhantes:
“A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça está fixada no sentido de que é de perigo abstrato o delito previsto no art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro e de que, para a tipificação do citado crime, a partir da vigência das Leis n.os 11.705/2008 e 12.760/2012, não há exigência quanto a estar comprovada a modificação da capacidade motora do agente.” (RHC 100.250/SP, j. 08/11/2018)
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