“Honra de marido enganado só com a morte dos culpados podia ser lavada”[1]. Essa era a voz que ecoava nos idos de 1925, na progressista Ilhéus, após o fazendeiro Jesuíno Mendonça matar a tiros de revólver sua esposa, Dona Sinhazinha Guedes Mendonça, e o Dr. Osmundo Pimentel, cirurgião-dentista, após flagrá-los em infidelidade conjugal.
Trata-se de reconhecida história marcada na célebre obra de Jorge Amado, “Gabriela, Cravo e Canela”, a qual, embora retrate romance que data de quase cem anos, parece ainda encontrar esteio em tempos hodiernos.
É que, recentemente, a 1.ª Turma do Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, manteve decisão de Júri que absolveu réu, contra a prova dos autos, em decisão envolvendo alegação defensiva de que o agente agiu amparado pela famigerada “legítima defesa da honra”[2].
O caso concreto submetido a julgamento pela Suprema Corte envolve acusado que tentou matar a esposa, quando ela saía de um culto religioso, com golpes de faca, porquanto imaginava ter sido traído. O réu, que era confesso, foi absolvido pelo Tribunal do Júri. O Ministério Público apelou, tendo o Tribunal de Justiça de Minas Gerais reformado a decisão, por vislumbrar que ela era contrária à prova dos autos, determinando, por corolário, a realização de um novo julgamento. O Superior Tribunal de Justiça, em sua hora, manteve a decisão do Tribunal Mineiro.
Segundo assentado pela maioria vencedora no STF (Ministros Marco Aurélio, Dias Toffoli e Rosa Weber), “não é possível ao Ministério Público recorrer de decisão do Tribunal do Júri que absolveu réu com base em quesito absolutório genérico”. A decisão fundamentou-se na soberania dos vereditos, salientando, ainda, que “a Constituição Federal prevê a soberania do Júri tanto para condenação quanto para absolvição”.
Saíram vencidos os Ministros Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso, que se lastrearam em precedentes da Corte, e, ainda, repeliram a argumentação envolta à legítima defesa da honra. Moraes sustentou que, a despeito de a soberania dos veredictos ser garantia constitucional, há possibilidade de segundo julgamento pelo conselho de sentença, no qual se esgotaria a análise probatória. Ainda, explicitou que o “quesito genérico tem a finalidade de simplificar a votação dos jurados, reunindo as teses da defesa, e não para transformar o corpo de jurados em um poder incontrastável, ilimitado, que não permita que outro conselho de sentença possa reanalisar”. O ministro Luís Roberto Barroso acompanhou o voto divergente e, no mais, assentou a necessidade de se garantir a prevenção geral, com o escopo de não se naturalizar o feminicídio.
Importante, na isagoge, mencionar que a decisão do STF no caso em testilha não se trata de matéria pacífica no âmbito da própria Corte, porquanto, recentemente (10.03.2020), a 1ª Turma determinou realização de novo Júri diante de absolvição de réu contra provas dos autos (RHC 170559)[3].
Pois bem, de pronto, entende-se que a mudança de entendimento da 1.ª Turma do STF (que se deve à alteração na composição do colegiado, em razão da saída do ministro Luiz Fux para a Presidência da Corte e do ingresso do ministro Dias Toffoli na Primeira Turma) apresenta, smj, claro retrocesso na interpretação dos preceitos constitucionais que envolvem a temática à baila.
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 5.°, inciso XXXVIII, prevê que os crimes dolosos contra vida serão julgados por um Tribunal Popular (julgamento do indivíduo por seus pares). A instituição do Júri trata-se de verdadeira cláusula pétrea (superconstitucional), configurando-se direito fundamental do cidadão e da sociedade. De mais a mais, nossa Carta Republicana tratou de estabelecer, expressamente, as balizas que regem o Tribunal do Júri, quais sejam, a plenitude de defesa, o sigilo das votações, a soberania dos veredictos e a competência para julgamento dos crimes dolosos contra a vida.
Por sua vez, o Código de Processo Penal (CPP) regulamentou o procedimento especial bifásico do Tribunal do Júri, registrando-se duas etapas bem delineadas. A primeira destina-se à formação da culpa, chamada de instrução preliminar, corresponde ao judicium accusationis. A segunda fase, conhecida por judicium causae, trata-se do julgamento em Plenário.
Na etapa do judicium causae, a sessão de julgamento é presidida por um juiz togado e o caso julgado pelo Conselho de Sentença, formado por sete jurados, sorteados na forma estabelecida nos art. 447 e seguintes do CPP, que são os juízes do fato, figuras que representam, com vigor, a democracia no seio do Poder Judiciário.
Como dito, vigora na seara do Tribunal do Júri o princípio da soberania dos veredictos (ex vi do próprio art. 5.°, inciso XXXVIII, da CF), significando, em epítome, que, por se tratar da vontade popular, a decisão dos jurados, no mérito, não pode ser, em regra, modificada por um Tribunal composto por juízes togados. Ou seja, o Tribunal não pode substituir a vontade exprimida pelo povo, representado, in casu, pelo Conselho de Sentença. Isso não importa em dizer, todavia, que o veredicto dado pelos jurados seja irrecorrível.
Sabe-se que a legislação brasileira prevê, no art. 593, inciso III, do CPP, hipóteses em que se apresenta possível recorrer da decisão do Tribunal do Júri (recurso de fundamentação vinculada), destacando-se, para a vexata quaestio que aqui se propõe, a alínea “d” (“for a decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos”). Nestas situações, o Tribunal, em respeito à soberania dos veredictos, não proferirá uma decisão de condenação ou absolvição do acusado, mas sim poderá, caso dê provimento ao apelum, determinar a cassação da decisão vergastada, para o fim de ser o agente submetido a novo julgamento.
Trata-se de preceito legal, plenamente vigente e compatível com a Carta Republicana, o qual evidencia que o princípio da soberania dos veredictos, embora de ordem constitucional (e fundamental, aliás), não se trata de direito absoluto (como, inclusive, salvo raríssimas exceções[4] defendidas por alguns doutrinadores, nenhum o é). Desta feita, relativiza-se o preceito da soberania dos veredictos, com a possibilidade submissão do acusado a um novo julgamento, no caso de o primeiro ser contrário à prova dos autos; é de bom alvitre gizar que não se admite, porém, pelo mesmo motivo, segunda apelação, nos moldes do § 3.° do art. 593 do CPP.
E mais, tanto não é absoluto o princípio da soberania dos veredictos que é majoritariamente admitida a hipótese de revisão criminal pelo órgão ad quem, nos casos de sentenças proferidas pelo Tribunal do Júri. Aliás, em tal situação, há ainda maior relativização do princípio da soberania dos veredictos, pois o Tribunal pode exercer tanto o juízo rescindente, quanto o rescisório[5].
Noutras palavras, o princípio da soberania dos veredictos não goza do status de direito absoluto em nosso ordenamento jurídico, sendo admissível, portanto, que, em caso de decisão proferida pelo Tribunal do Júri manifestamente contrária à prova dos autos, que se valham as partes do recurso de apelação, ao que o órgão ad quem poderá cassar o decisum e determinar a submissão do acusado a novo julgamento.
Não se obtemperar, de mais a mais, que a decisão proferida pelo STF, que ora se analisa, refere-se a caso concreto em que a alegação defensiva pautou-se na “legítima defesa da honra”, envolvendo desconfiança do réu em relação à suposta traição de sua esposa.
O instituto da legítima defesa trata-se de excludente da ilicitude/antijuridicidade e encontra ressonância no art. 25 do Código Penal, o qual prevê o seu conceito e requisitos: “Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.”
Existe polêmica em torno da admissibilidade da legítima defesa da honra. A priori, como bem pontua Masson[6], é preciso que se faça a distinção entre os três aspectos distintos da honra: a) respeito pessoal, envolvendo a dignidade e o decoro, bens jurídicos tutelados pelos crimes contra a honra, sendo possível a legítima defesa, com emprego de força física e moderada; b) liberdade sexual, admite-se, por exemplo, a legítima defesa da vítima em face daquele que tenta lhe estuprar; c) infidelidade conjugal.
É exatamente no terceiro aspecto da honra que reside a problemática objeto da decisão do STF. Como cediço, na época do Brasil colonial, na égide das Ordenações Filipinas, o marido tinha o direito de agredir e até matar a esposa flagrada em adultério[7]. Prosseguindo, no Código Criminal do Império, de 1830, não houve mais a previsão do direito de o homem matar sua esposa em razão do adultério, embora constassem diferenciações[8] no crime de adultério quando perpetrado pela mulher e quando praticado pelo homem. O Código Penal de 1890, do período republicano, além de manter as diferenciações com relação à tipificação do adultério com lastro nos gêneros, ao conceituar a legítima defesa, acabou por, nas palavras de Barsted e Hermann, “legitimar a continuidade dos assassinatos de mulheres consideradas infiéis”[9], ao prever os institutos excludentes da ilicitude, inclusive a legítima defesa. O Código Penal de 1940, por sua vez, continuou a prever o adultério como crime[10], mas com a punição idêntica para ambos os cônjuges, e manteve, por outro lado, os institutos excludentes da antijuridicidade.
Diante da previsão legal da legítima defesa (ou mesmo sob às vestes de excludente de culpabilidade, no âmbito da inexigibilidade de conduta diversa), várias vozes advogaram (e advogam) a legítima defesa da honra para casos de infidelidade conjugal. Todavia, a evolução da sociedade e todo o arcabouço normativo formado, ao longo dos anos, evidenciaram claramente que não é “autorizado” ao cônjuge tirar a vida do outro em razão de infidelidade (ou por desconfiança de sua ocorrência). Como disserta Masson:
Atualmente, depois de muita discussão, e, notadamente, com a evolução da sociedade e com o respeito aos direitos da mulher, prevalece o entendimento de a traição conjugal não humilha o cônjuge traído, mas sim o próprio traidor, que não se mostra preparado para o convívio familiar.
Além disso, respeita-se o caráter fragmentário e a subsidiariedade do Direito Penal, que não deve ser chamado para resolver o impasse, pois o ordenamento jurídico prevê outras formas menos gravosas para essa finalidade. Com efeito, admite-se a separação e também o divórcio litigioso, fundados na violação dos deveres do matrimônio. E ainda no campo civil, tem-se aceitado até mesmo a indenização por danos morais ao cônjuge prejudicado pela traição.
Essa posição se reforça com a descriminação do crime de adultério, revogado pela Lei 11.106/2005.
Deveras, se não se admite sequer a responsabilização penal de quem trai o seu cônjuge, com maior razão infere-se que o Direito Penal não autoriza a legítima defesa da honra, principalmente com o derramamento de sangue do traidor[11].
Ora, não se pode olvidar, também, que autorizar a legítima defesa da honra em situações envolvendo violência doméstica e familiar (sobretudo contra mulher, que são, não se pode negar , as situações mais corriqueiras de utilização de tal subterfúgio), contraria, inclusive, o princípio da proporcionalidade, em seu vetor positivo, referente à proibição da proteção insuficiente de bens jurídicos, sobretudo daqueles eleitos pela própria Carta Magna (art. 226, § 8.° O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações).
Nesse aspecto, é de bom alvitre lembrar que a situação da violência doméstica e familiar contra a mulher no Brasil foi objeto de caso levado à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CASO 12.051 MARIA DA PENHA MAIA FERNANDES VS BRASIL), que expediu diversas recomendações ao Estado Brasileiro, não raras vezes omisso na repreensão/prevenção dessa espécie de crimes, destacando-se, dentre elas, “prosseguir e intensificar o processo de reforma que evite a tolerância estatal e o tratamento discriminatório com respeito à violência doméstica contra mulheres no Brasil.”
Após alguns anos, emanou-se no cenário brasileiro a Lei Maria da Penha, a qual encontra supedâneo não só na recomendação emanada pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, mas também no § 8.° do art. 226 da Constituição Federal, na Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e na Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher.
A Lei n. 11.340/2006 veio para melhor tutelar as mulheres sujeitas à violência doméstica e familiar, tendo o mote principal evitar que o agressor pratique ou volte a praticar atos reprováveis contra elas.
A lei proporciona maior acesso à justiça criminal pelas mulheres vítimas de violências de toda ordem, pois os seus dispositivos permitem que tenham mais coragem no momento de delatar os agressores às autoridades públicas. Destarte, a lei atende ao princípio da isonomia, mormente em seu aspecto material, devido a suprir uma demanda histórica de melhor tutela jurídico-legal dos interesses e direitos das mulheres.
Ainda, mais recentemente, com a Lei n. 13.104/2015, foi inserido no Código Penal o crime de feminicídio, que consiste no homicídio praticado contra mulher por razões da condição do sexo feminino (seja envolvendo violência doméstica e familiar, seja por menosprezo ou discriminação à condição de mulher).
Mesmo com o endurecimento penal em relação aos crimes envolvendo violência doméstica e familiar contra mulher, o Brasil continua a ter altos índices de feminicídios, registrando, em 2019, 1.314 casos (um aumento de 12% em relação ao ano anterior)[12]. A interpretação das normas vigentes, em violação ao princípio da proibição da proteção insuficiente[13], apenas vem, infelizmente, a dificultar a superação de tal quadro.
Diante de todo esse contexto, inviável se falar em legítima defesa da honra em situações envolvendo infidelidade (suposta ou comprovada) conjugal[14]. Admitir situações deste naipe seria ir de encontro à toda construção solidificada, a duras penas, em terra brasilis.
Em uma interpretação coordenada, proporcional e ponderada das normas legais vigentes, pode-se dizer que o princípio da soberania dos veredictos não goza de caráter absoluto a ponto de impedir que uma decisão do conselho de sentença, manifestamente contrária à prova dos autos, seja submetida a um novo julgamento.
Entender de forma diferente e, sobretudo, em casos envolvendo alegação de legítima defesa da honra por infidelidade conjugal, far-nos-ia retroagir àquela Ilhéus de 1925, onde “modificava-se a fisionomia da cidade, abriam-se ruas, importavam-se automóveis, construíam-se palacetes, rasgavam-se estradas, publicavam-se jornais, fundavam-se clubes; (…) lentamente porém evoluíam os costumes, os hábitos dos homens.”[15].
[1] AMADO, Jorge. Gabriela, Cravo e Canela. Petrópolis – Rio, maio de 1958.
[2]Disponível em: http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=452595&ori=1 Acesso em: 16.10.2020.
[3] Disponível em: http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=438965&ori=1 Acesso em 17.10.2020.
[4] Paulo Gustavo Gonet Branco ensina: “Tornou-se voz corrente na nossa família do Direito admitir que os direitos fundamentais podem ser objeto de limitações, não sendo, pois, absolutos. Tornou-se pacífico que os direitos fundamentais podem sofrer limitações, quando enfrentam outros valores de ordem constitucional, inclusive outros direitos fundamentais. Pietro Sanchis noticia que a afirmação de que ‘não existem direitos ilimitados se converteu quase em cláusula de estilo na jurisprudência de todos os tribunais competentes em matéria de direitos humanos.’ Igualmente no âmbito internacional, as declarações de direitos humanos admitem expressamente limitações ‘que sejam necessárias para proteger a segurança, a ordem, a saúde ou a moral pública ou os direitos e liberdades fundamentais de outros’. A leitura da Constituição brasileira mostra que essas limitações são, às vezes, expressamente previstas no Texto. Até o elementar direito à vida tem limitação explícita no inciso XLVII, a, do art. 5.°, em que contempla a pena de morte em caso de guerra formalmente declarada. Não há, portanto, em princípio, que falar entre nós, em direitos absolutos. Tanto outros direitos fundamentais como outros valores em sede constitucional podem limitá-los.” Ainda, cita que: “Bobbio, não obstante, menciona um direito proclamado em instrumentos internacionais, que seria absoluto: o direito a não ser escravizado.” (MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional, São Paulo: Saraiva, 2015, pp. 143-144).
[5] Sobre o tema, professora Renato Brasileiro de Lima: “Prevalece na doutrina e na jurisprudência o entendimento de que ao Tribunal de Justiça é conferida a possibilidade de, em sede de revisão criminal, proceder ao juízo rescindente e rescisório. Assim, se o Tribunal togado se convencer que a sentença condenatória se fundou em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos, pode, desde já, absolver o acusado, não havendo necessidade de submetê-lo a novo julgamento perante o júri. Portanto, na ação autônoma de impugnação que é a revisão criminal, o tribunal de segundo grau tem competência tanto para o juízo rescindente, consistente em desconstituir a sentença do tribunal do júri, quanto para o juízo rescisório, consistente em substituir a decisão do júri por outra do próprio tribunal de segundo grau.” DE LIMA, Renato Brasileiro. Manual de Processo Penal. Volume Único. Salvador: Ed. Jus Podivm, 2020, p. 1447.
[6] MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado: Parte Geral. São Paulo: Método, 2013, p. 421.
[7] Título XXV do mencionado compêndio assim recomendava: “E toda mulher, que fazer adultério a seu marido, morra por isso. E se ella para fazer o adultério por sua vontade se fôr com alguém de caza de seu marido, ou donde a seu marido tiver, se o marido della querelar, ou a accusar, morra morte natural” (apud PIERANGELLI, J. H. Códigos Penais do Brasil: evolução histórica. Bauru-SP: Jalovi, 1980. p.33). Ainda, em seu título XXXVIII, dispunha “[…] não somente poderá o marido matar sua mulher e o adultero, que achar com ella em adultério, mas ainda os póde licitamente matar, sendo certo que lhe cometterão adultério; e entendendo assi provar, e provando depois o adultério per prova licita e bastante conforme á Direito, será livre sem pena alguma, salvo nos casos sobreditos, onde serão punidos segundo acima dito he.” (apud PIERANGELLI, J. H. Códigos Penais do Brasil: evolução histórica. Bauru-SP: Jalovi, 1980, p.42).
[8] Quando o homem fosse o autor do delito, fazia-se mister a comprovação de que mantinha com a outra mulher uma relação estável e douradora, o que não era exigível para configuração do delito quando a mulher fosse a autora do crime.
[9] BARSTED e HERMANN, 1995, p. 55 apud RAMOS, Margarita Danielle. Reflexões sobre o processo histórico-discursivo do uso da legítima defesa da honra no Brasil e a construção das mulheres. Rev. Estud. Fem., Florianópolis , v. 20, n. 1, p. 53-73, Apr. 2012 . Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-026X2012000100004&lng=en&nrm=iso>. access on 16 Oct. 2020. https://doi.org/10.1590/S0104-026X2012000100004.
[10] Tal crime foi revogado formalmente somente com a Lei n. 11.106/2005.
[11] Ibidem.
[12] Disponível em: https://g1.globo.com/monitor-da-violencia/noticia/2020/03/05/mesmo-com-queda-recorde-de-mortes-de-mulheres-brasil-tem-alta-no-numero-de-feminicidios-em-2019.ghtml Acesso em 16.10.2019.
[13] Tangente à temática, ensina Luiz Eduardo Sant’Anna Pinheiro: “De uns tempos para cá, passou-se a refletir com maior acuidade acerca desse vácuo normativo e interpretativo, em que umas das soluções apontadas consiste em uma nova interpretação do princípio da proporcionalidade. Com isso, atualmente não deve ser visto apenas como ‘vedação do excesso’, devendo igualmente ser alinhavado com a diretriz da ‘vedação à proteção deficiente’.” (PINHEIRO, Luiz Eduardo Sant’Anna. A Dupla Face do Garantismo Penal e Implicações no Direito Brasileiro. Campo Grande: Contemplar, 2020, p. 147).
[14] Rogério Sanches Cunha traz excelente julgado do STJ em sua obra Manual de Direito Penal, Parte Geral, acerca do tema: “O STJ negou provimento a recurso especial interposto por um indivíduo que, denunciado por matar a esposa estrangulada após uma festa, buscava a absolvição por legítima defesa da honra. O Ministro Rogerio Schietti Cruz repudiou o argumento da defesa segundo o qual a vítima teria adotado ‘atitudes repulsivas’ e provocativas contra o marido, o que justificaria o reconhecimento de legítima defesa da honra e a absolvição sumária do réu. Disse o ministro: ‘Embora seja livre a tribuna e desimpedido o uso de argumentos defensivos, surpreende saber que ainda se postula, em pleno ano de 2019, a absolvição sumária de quem retira a vida da companheira por, supostamente, ter sua honra ferida pelo comportamento da vítima. Em um país que registrou, em 2018, a quantidade de 1.206 mulheres vítimas de feminicídio, soa no mínimo anacrônico alguém ainda sustentar a possibilidade de que se mate uma mulher em nome da honra do seu consorte.”. No caso, durante uma festa, a vítima teria dançado e conversado com outro rapaz, o que gerou a ira e despertou os ciúmes do marido, que estaria alcoolizado. Ela também teria dito que queria romper o relacionamento. Em casa, o homem apoderou-se de uma corda e laçou o pescoço da mulher, matando-a por asfixia.” (CUNHA, Rogério Sanches: Parte Geral. Salvador: Jus Podivm, 2020, p. 337.
[15] Op. Cit. pp. 03-04.