Nota de atualização 2
ICMS
Mesmo após a EC 87/2015, é necessária a edição de uma lei complementar federal
para que se possa cobrar o Diferencial de Alíquota do ICMS (Difal)
– Uma atualização sobre ICMS!
– Exatamente! Uma atualização muito importante, principalmente para fins de provas de PGE. Portanto, preste muita atenção.
– Pode deixar, professora!
– Segundo o Supremo Tribunal Federal, a cobrança do diferencial de alíquota alusivo ao ICMS, conforme introduzido pela Emenda Constitucional nº 87/2015, pressupõe edição de lei complementar veiculando normas gerais. Logo, é necessária a edição de uma lei complementar, disciplinando o assunto tratado pela referida emenda constitucional, para que os estados membros e o Distrito Federal, na qualidade de entes destinatários de bens ou serviços, possam cobrar Diferencial de Alíquota do ICMS (Difal) na hipótese de operações e prestações interestaduais com consumidor final não contribuinte do Imposto[1].
– Ixi…não entendi nada, professora!
– Como você sabe, o ICMS é um imposto estadual previsto no art. 155, II, da CF/88 e na LC 87/96 (Lei Kandir). Isso já estudamos detalhadamente no livro “Diálogos sobre o Direito Tributário e Financeiro”.
– Sim! E sei que um dos fatos geradores do ICMS é a circulação de mercadorias.
– Muito bem!
Aposto que durante o lockdown você tenha adquirido mercadorias pela internet, não é mesmo? Eu adquiri várias…
– Adquiri sim, professora! Comprei um celular novinho.
– Pois bem. Vamos supor que você tenha adquirido esse bem de uma loja situada no Estado de São Paulo e, como sei, você reside em Recife (PE), onde o celular foi entregue. Perceba que nesse caso houve circulação da mercadoria e, consequentemente, o pagamento do ICMS.
– Onde você quer chegar, professora?
– Seguinte…se houve pagamento do imposto estadual, a quantia referida ficará com qual ente estadual? São Paulo ou Pernambuco?
– Não sei…
– Vamos analisar as situações, conforme dispunha a Constituição Federal antes das modificações trazidas pela EC 87/2015.
A primeira situação é quando o adquirente da mercadoria for um consumidor final e, também, contribuinte do referido imposto estadual. Suponha que uma rede de drogarias aí do Recife tenha adquirido vários computadores para uso em suas lojas. Ou seja, é consumidora final, mas também, contribuinte do ICMS no que tange à circulação de mercadorias de seus estabelecimentos, isto é, medicamentos, por exemplo.
Nessa situação, teríamos a divisão da arrecadação do ICMS entre ambos os estados membros da Federação, uma vez que o referido imposto estadual será cobrado duas vezes: a primeira, quando sair do estabelecimento do vendedor, sendo aplicável a alíquota interestadual, ficando o valor com o Estado de origem; e quando a mercadoria entrar no estabelecimento de quem a comprou, sendo aplicável a diferença entre a alíquota interna do Estado de destino e a alíquota interestadual, ficando, o valor obtido, com o Estado de destino.
– E se o adquirente da mercadoria não for contribuinte do ICMS, no caso, eu?
Essa é a segunda situação! Você é o consumidor final, no entanto, não pode ser considerado como contribuinte do referido imposto estadual.
Nesse caso, aplica-se a alíquota interna do Estado do vendedor da mercadoria…
– E com quem fica o valor devido do ICMS?
– Ficará com o Estado de origem, ou seja, do vendedor!
Ainda, sobre as regras anteriores à edição da EC 87/2015, temos, também, a hipótese do adquirente da mercadoria não ser um consumidor final.
– Como assim?
– Imagine uma loja de roupas, localizada em Recife, que compra no atacado do Bom Retiro, na cidade de São Paulo/SP, para revender. Neste caso, não se pode falar em consumidor final. Logo, aplica-se a alíquota interestadual e todo o valor arrecadado, a título de ICMS, ficará com o Estado de origem.
– Professora, por essas regras anteriores à EC 87/2015, pude perceber que há uma concentração dos valores arrecadados de ICMS no Estado de São Paulo, visto que é o estado membro mais industrializado.
– Boa percepção!
Por conta disso, muitos estados membros das regiões Norte e Nordeste teceram críticas à essa distribuição injusta que a Constituição Federal de 1988 previa.
Com o advento da EC 87/2015, quando temos a aquisição de uma mercadoria por um consumidor final que não seja contribuinte do ICMS, passou-se a incidir duas alíquotas: a alíquota interestadual e a diferença entre a alíquota interna do Estado de destino e a interestadual, sendo que o valor arrecadado será dividido entre o Estado de origem e o Estado de destino.
– Seria o valor obtido com a aplicação da alíquota interestadual destinado ao Estado de Origem e o valor obtido com a aplicação da diferença entre a alíquota interna do Estado de destino e a interestadual, com o Estado de destino?
– Exatamente isso!
Essa diferença é chamada de Diferencial de Alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (Difal/ICMS).
– Isso tudo já vimos no livro, professora! Qual a novidade?
Com a edição da EC 87/2015, os Estados membros e o Distrito Federal firmaram o Convênio ICMS 93/2015, editado pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), com a finalidade de concretizar toda essa situação trazida pela referida emenda constitucional, disciplinando a cobrança da Difal/ICMS.
No entanto, não caberia aos Estados membros e ao Distrito Federal disporem sobre essa disciplina, mas sim, à União.
– Porque a União detém a competência de editar uma norma geral de caráter nacional sobre o tema!
– Muito bem!
E, como você bem sabe, a norma geral de caráter nacional é a lei complementar[2], não sendo cabível que tal matéria fosse tratada por outro instrumento legislativo.
– Então, estamos diante de um vício formal de inconstitucionalidade!
– Isso mesmo!
– A Lei Kandir não trata sobre esse assunto, né?
– Não!
– Então, é necessário que a União edite uma lei complementar sobre o Difal!
– Sim.
Interessante mencionar que alguns Estados membros editaram normas disciplinando o Difal. Nesse caso em tela, são válidas as leis estaduais ou distritais editadas após a EC 87/2015, que preveem a cobrança do Difal nas operações e prestações interestaduais com consumidor final não contribuinte do imposto. No entanto, não produzem efeitos enquanto não editada lei complementar dispondo sobre o assunto.
Diante disso, o Supremo Tribunal Federal, entendeu que é inválida a cobrança do Difal na operação interestadual envolvendo mercadoria destinada a consumidor final não contribuinte, considerando que não existe lei complementar disciplinadora e declarou a inconstitucionalidade formal das cláusulas primeira, segunda, terceira, sexta e nona do Convênio ICMS 93/2015, uma vez que tratam de matéria que deveria ser disciplinada em lei complementar de caráter nacional, sendo competência da União para editá-la.
– Essa decisão já está valendo, professora?
– Nesse ano, não. O Supremo Tribunal Federal modulou os efeitos para que a decisão produza efeitos somente a partir de 2022, exercício financeiro seguinte à data do julgamento.
[1] STF. Plenário. ADI 5469/DF, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 24/2/2021 (Info 1007).
STF. Plenário. RE 1287019/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, redator do acórdão Min. Dias Toffoli, julgado
em 24/2/2021 (Repercussão Geral – Tema 1093) (Info 1007).
[2] Art. 155, § 2º XII, CF/88 – cabe à lei complementar:
- a) definir seus contribuintes;
- b) dispor sobre substituição tributária;
- c) disciplinar o regime de compensação do imposto;
- d) fixar, para efeito de sua cobrança e definição do estabelecimento responsável, o local das
operações relativas à circulação de mercadorias e das prestações de serviços;
- e) excluir da incidência do imposto, nas exportações para o exterior, serviços e outros produtos
além dos mencionados no inciso X, “a”;
- f) prever casos de manutenção de crédito, relativamente à remessa para outro Estado e
exportação para o exterior, de serviços e de mercadorias;
- g) regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções,
incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados.
- h) definir os combustíveis e lubrificantes sobre os quais o imposto incidirá uma única vez, qualquer
que seja a sua finalidade, hipótese em que não se aplicará o disposto no inciso X, b;
- i) fixar a base de cálculo, de modo que o montante do imposto a integre, também na importação
do exterior de bem, mercadoria ou serviço.