Informativo: 856 do STF – Direito Penal
Resumo: Para a consumação do delito do art. 89 da Lei nº 8.666/93 é necessário que se revele desvalor maior para o ordenamento jurídico do que a observância parcial ou imperfeita de normas procedimentais.
Comentários:
O art. 89 da Lei nº 8.666/93 pune as condutas de dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade.
A dispensa e a inexigibilidade da licitação são disciplinadas nos artigos 24 e 25 da mesma Lei, que elencam, respectivamente, situações nas quais, embora possível a realização do certame, confere-se ao administrador a possibilidade de contratação direta, e situações em que a competição, em virtude das circunstâncias particulares que envolvem o produto ou o serviço, é inviável.
Em tese, uma vez descumpridas as normas que disciplinam a dispensa e a inexigibilidade, há o delito do art. 89 da Lei nº 8.666/93, modalidade de crime formal, isto é, que dispensa o resultado naturalístico (efetivo prejuízo ao erário), e que não estabelece nenhuma finalidade específica expressa.
Não obstante, a orientação dos tribunais superiores se firmou no sentido de que que o crime só se caracteriza quando o agente atua com propósito de causar prejuízo ao erário e efetivamente o causa. A respeito, podemos citar o HC 377.711/SC (julgado pelo STJ em 09/03/2017) e a ação penal 683/MA (julgada pelo STF em 09/08/2016).
Durante o julgamento proferido no Inq 3674/RJ, no qual se analisava a denúncia oferecida contra deputado federal por crime licitatório cometido no exercício do cargo de prefeito municipal, embora tenha concluído que se trata de crime formal – contrariando portanto o que vinha decidindo –, o STF manteve a orientação a respeito da necessidade de finalidade específica. Segundo a decisão – que rejeitou a denúncia –, o fato de não se exigir o resultado naturalístico consistente no prejuízo ao erário não afasta a necessidade de que o agente público aja com finalidade de causar o prejuízo. Para o tribunal, o ilícito penal não pode ser igualado ao ilícito administrativo. Se este último ocorre pela simples atuação irregular do agente público (ainda que com observância parcial ou imperfeita de normas procedimentais), o crime só existe se a conduta é permeada pela finalidade de obter um proveito criminoso de qualquer natureza.
Na mesma ocasião, o STF apresentou três critérios para analisar se determinada conduta efetivamente se subsume ao art. 89:
1) A existência de parecer jurídico idôneo: Nas situações em que o corpo jurídico do órgão público lavra parecer favorável à dispensa ou à inexigibilidade, e não há indícios de que se trata de etapa fraudulenta para o cometimento do crime, deve-se considerar juridicamente válido o ato de dispensa ou de inexigibilidade, pois, diante de parecer técnico idôneo, não é possível considerar que o procedimento de não realização do certame tenha ocorrido dolosamente sem a observância das formalidades estabelecidas pela lei.
2) Indicação, na denúncia, da especial finalidade de lesar o erário ou promover enriquecimento ilícito dos acusados: Como já ressaltamos, este critério já vinha sendo utilizado para diferenciar a conduta criminosa do ilícito meramente administrativo. O crime independe da prova do resultado danoso, mas a conduta só pode ser considerada criminosa quando narrada a finalidade de lesar o erário, de obter vantagem indevida ou de beneficiar patrimonialmente o particular contratado.
3) Indicação de vínculo subjetivo entre os agentes: Embora o crime do art. 89 não seja plurissubjetivo, a maioria das imputações envolve diversas pessoas. Nesses casos, é imprescindível que a denúncia descreva o vínculo subjetivo entre os agentes. Não basta a descrição do ato administrativo irregular e a inclusão de todos que tomaram parte na sua realização.
Inq 3674/RJ
Para se aprofundar, recomendamos:
Curso: Carreira Jurídica (mód. I e II)
Curso: Intensivo para o Ministério Público e Magistratura Estaduais + Legislação Penal Especial