O art. 28 da Lei nº 11.343/06 pune quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. As penas consistem em advertência sobre os efeitos das drogas, prestação de serviços à comunidade e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.
Nota-se, portanto, que a posse de drogas para uso próprio não acarreta nenhuma espécie de privação de liberdade, o que, desde a entrada em vigor da Lei nº 11.343/06, provoca debates a respeito da natureza jurídica da infração, ou seja, se ainda permanece a natureza de infração penal ou se houve a descriminalização.
No julgamento do RE 430.105/RJ, o STF considerou que a posse de drogas para consumo pessoal mantém a natureza criminosa, diferenciando-se das demais figuras delituosas apenas quanto às consequências, já que não se aplica pena privativa de liberdade. O tribunal, no entanto, julga atualmente o recurso extraordinário nº 635.659, no qual se discute a constitucionalidade do art. 28. Para Gilmar Mendes, que já apresentou seu voto, as sanções descritas no dispositivo passam a ter caráter exclusivamente administrativo, pois a punição criminal “estigmatiza o usuário e compromete medidas de prevenção e redução de danos, bem como gera uma punição desproporcional ao usuário, violando o direito à personalidade”. Os ministros Roberto Barroso e Edson Fachin também consideraram inconstitucional a criminalização, mas limitaram seus votos à maconha, a que se referem os fatos tratados no recurso.
O STJ tem seguido o mesmo entendimento firmado pelo STF no RE 430.105, isto é, considera que a conduta de posse de droga para uso pessoal mantém a natureza criminosa, apesar da despenalização promovida pela Lei nº 11.343/06.
Embora a despenalização impeça a aplicação de pena privativa de liberdade, a natureza criminosa da conduta pode provocar efeitos na pena aplicada em outros crimes. Dessa forma, a condenação anterior pelo cometimento de uma das condutas do art. 28 da Lei nº 11.343/06 pode sem dúvida atrair a agravante da reincidência:
“A conduta prevista no art. 28 da Lei n. 11.343⁄06 conta para efeitos de reincidência, de acordo com o entendimento desta Quinta Turma no sentido de que, “revela-se adequada a incidência da agravante da reincidência em razão de condenação anterior por uso de droga, prevista no artigo 28 da Lei n. 11.343⁄06, pois a jurisprudência desta Corte Superior, acompanhando o entendimento do col. Supremo Tribunal Federal, entende que não houve abolitio criminis com o advento da Lei n. 11.343⁄06, mas mera “despenalização” da conduta de porte de drogas” (HC 314594⁄SP, rel. Min. FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, DJe 1⁄3⁄2016)” (HC 354.997/SP, j. 28/03/2017).
É também possível que a condenação impeça a incidência da minorante no crime de tráfico. O art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06 estabelece a diminuição de um sexto a dois terços da pena se o agente for primário, de bons antecedentes, não se dedicar a atividades delituosas nem integrar organização criminosa. Portanto, diante do pressuposto de primariedade e de bons antecedentes, o condenado pela posse de drogas para uso pessoal não faz jus à benesse concedida ao denominado pequeno traficante:
“1. No caso, a aplicação da minorante foi afastada, em decisão suficientemente motivada, a qual reconheceu a existência de condenação anterior por uso de entorpecentes. 2. Esta Corte Superior possui entendimento de que não houve a descriminalização do porte de drogas para uso próprio com a entrada em vigor da Lei n. 11.343⁄2006, mas mera despenalização, tendo em vista a previsão de penas alternativas para o infrator. Desse modo, a condenação definitiva anterior pela prática da conduta prevista no art. 28 da Lei de Drogas é circunstância apta a impedir a aplicação do redutor previsto no art. 33, § 4º, da referida Lei” (AgRg no AREsp 971.203/SP, j. 09/05/2017).
E, evidentemente, a condenação pela prática da conduta tipificada no art. 16 da revogada Lei nº 6.368/76 mantém seus efeitos (exceto a pena privativa de liberdade, pois as disposições da nova lei, benéficas, retroagem):
“A condenação definitiva anterior pela prática da conduta prevista no art. 16 da Lei n. 6.368⁄1976 é circunstância apta a autorizar a majoração da pena, pela incidência da agravante da reincidência, e para impedir a aplicação do redutor do art. 33, § 4º, da referida Lei, uma vez que, segundo entendimento firmado nesta Corte, não houve a descriminalização do porte de substâncias entorpecentes para uso próprio, com a entrada em vigor da Lei n. 11.343⁄2006, mas apenas a despenalização” (HC 360.123/SP, j. 15/09/2016).
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