Informativo: 617 do STJ – Processo Penal
Resumo: É possível que o Juiz de primeiro grau, fundamentadamente, imponha a parlamentares municipais as medidas cautelares de afastamento de suas funções legislativas sem necessidade de remessa à Casa respectiva para deliberação.
Comentários:
A Constituição Federal estabelece, em seu art. 53, § 2º, que, “Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão”. Trata-se da imunidade relativa à prisão, também denominada “incoercibilidade pessoal dos congressistas (freedom from arrest)”.
O texto constitucional em nenhum momento faz referência a outras possibilidades cautelares de encarceramento, como as prisões temporária e preventiva. Ocorre que, nos últimos anos, foram incontáveis os casos envolvendo parlamentares federais em crimes contra a Administração Pública e de organização criminosa. Desde o escândalo do Mensalão, que corria paralelo a outro esquema de corrupção desmantelado durante a operação Lava Jato, temos assistido a inúmeros membros do Poder Legislativo (e do Executivo) envolvidos nos mais diversos atos de malversação e apropriação de dinheiro público.
Essa multiplicação de crimes levou o STF a tomar, nessa seara, algumas decisões nas quais se promoveu uma leitura restritiva da imunidade relativa à prisão. Em síntese, pode-se dizer que o tribunal passou a admitir não só a prisão cautelar como também a imposição de medidas diversas da prisão, inclusive aquelas que limitam o exercício do mandato parlamentar.
Isso levou a outra decisão (ADI 5526), que, conferindo interpretação conforme a Constituição aos artigos 312 e 319 do CPP, estabeleceu que a aplicação das medidas cautelares impostas a parlamentares deve ser submetida a deliberação da respectiva Casa Legislativa em vinte e quatro horas, seguindo a regra relativa à apreciação da prisão em flagrante (art. 53, § 2º, da CF).
A decisão tomada pelo STF, no entanto, teve alguns efeitos indesejáveis.
Um deles foi o episódio ocorrido no Estado do Rio de Janeiro, no qual a Assembleia Legislativa, replicando no âmbito estadual o que decidira o STF sobre os parlamentares federais, decidiu deliberar sobre prisão cautelar decretada contra deputados estaduais e revogou a medida. Isso, aliás, provocou o ajuizamento de novas ações no STF (ADI’s 5823, 5824 e 5825), que, por enquanto, se manifesta majoritariamente pela não aplicabilidade, na esfera estadual, de sua decisão na ADI 5526 (as ações estão suspensas aguardando votos de dois ministros).
Outro efeito foi a tentativa de aplicar a decisão do STF na ADI 5526 na esfera municipal. Ocorre que, inegavelmente, a simetria que se pretendeu estabelecer em favor dos deputados estaduais não existe no âmbito dos municípios. Os vereadores, por força do art. 29, VIII, da CF/88, desfrutam somente de imunidade absoluta, desde que as suas opiniões, palavras e votos sejam proferidos no exercício do mandato (nexo material) e na circunscrição do município (critério territorial). A Constituição Estadual pode prever foro especial para o processo e julgamento de determinadas infrações penais, mas os vereadores não estão imunes a qualquer tipo de prisão.
Por isso, decidiu o STJ, no RHC 88.804/RN, que é lícito ao juiz de primeiro grau impor aos vereadores medidas cautelares de afastamento de suas funções legislativas sem necessidade de remessa à Câmara de Vereadores para deliberação.
No caso julgado, a primeira instância havia imposto, contra um vereador, medida cautelar de afastamento de suas funções de vereança e de presidente da Câmara Municipal de Natal/RN. Ocorre que, baseando-se na decisão tomada pelo STF na ADI 5526, o parlamento municipal deliberou pelo retorno do vereador às suas funções.
Mas o STJ, considerando inclusive decisões do STF nas quais a imunidade de prisão não havia sido reconhecida em benefício de vereadores, tornou sem efeito a deliberação feita pela Câmara de Vereadores de Natal.
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