Informativo: 958 do STF – Processo Penal
Resumo: O condenado não tem o direito subjetivo de perseguir a desconstituição da condenação penal fora das situações legais que admitem a revisão criminal.
Comentários:
O art. 621 do CPP estabelece que a revisão dos processos finalizados é admitida:
I – quando a sentença condenatória for contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos;
II – quando a sentença condenatória se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos;
III – quando, após a sentença, se descobrirem novas provas de inocência do condenado ou de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena.
Trata-se de uma ação autônoma destinada a desfazer os efeitos de uma sentença penal transitada em julgado. Na lição de Bento de Faria, vazada em Manzini, “é um meio processual deferido ao condenado para demonstrar, a todo o tempo, a injustiça da decisão que o condenou, e obter, assim, a respectiva anulação, ou a modificação da pena ou mesmo a absolvição” (Código de processo penal, vol. 2, p. 342).
No processo penal, exatamente porque se lida com a liberdade das pessoas, há uma incessante busca pela verdade real. De tal maneira que, descobrindo-se a verdade, abre-se sempre a possibilidade de alteração da sentença. Nada impede que determinada sentença, embora acobertada pela coisa julgada, contenha um equívoco. Não teria cabimento, por exemplo, que o réu definitivamente condenado pela prática de um homicídio permanecesse preso mesmo com o surgimento da suposta vítima viva. Exatamente para propiciar a correção do erro judiciário é que se concebe a revisão criminal. Nesse aspecto, a revisão guarda grande semelhança com a ação rescisória, prevista no Código de Processo Civil (v. art. 966 e ss., do CPC). Aliás, se até o processo civil vislumbrou, através da rescisória, uma maneira de reparar o erro, não teria cabimento que, no processo penal, não se dispusesse de instrumento semelhante.
Não se trata, contudo, de uma ação destinada a simplesmente contestar a condenação por inconformismo, papel atribuído sobretudo ao recurso de apelação. Basta uma leitura superficial dos incisos do art. 621 para concluir que a revisão criminal foi concebida para reparar efetivos erros que possam ter influenciado o juiz, não para desconstituir o título condenatório porque o condenado o considera injusto.
Com base nisso, o Plenário do STF, por maioria, não conheceu de revisão criminal em que um senador condenado pela 1ª Turma do tribunal buscava a redução da pena imposta. Segundo a decisão, não há direito subjetivo à revisão do édito condenatório, cabendo ao condenado o ônus processual de demonstrar que seu pedido se adéqua a uma das hipóteses de cabimento elencadas no art. 621 do CPP:
“O Plenário, por maioria, não conheceu de revisão criminal ajuizada por senador condenado pela Primeira Turma do STF à pena de 4 anos e 6 meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, pela prática do delito previsto no art. 20 da Lei 7.492/1986.
Inicialmente, o Colegiado resolveu questão de ordem suscitada pelo ministro Marco Aurélio para determinar a continuidade do julgamento. De acordo com o suscitante, deveria haver a redistribuição do processo no tocante ao ministro revisor, que atuou como relator da ação penal discutida nessa revisão criminal.
No ponto, o Plenário considerou que os arts. 76 e 77 do RISTF se referem à relatoria do processo, e não à figura do revisor. Além disso, a defesa não se insurgiu em relação a esse fato. Por sua vez, o novo CPC aboliu a figura do revisor na ação rescisória.
Vencido o suscitante, que entendeu ser necessária a redistribuição, considerada a interpretação sistemática dos arts. 76 e 77 do RISTF.
Ato contínuo, o Plenário reputou que o condenado não tem o direito subjetivo de perseguir a desconstituição do título penal condenatório fora da destinação legal do meio de impugnação. Dessa forma, a coisa julgada penal, excepcionalmente, admite desfazimento, mas desde que preenchidas as hipóteses taxativamente previstas no art. 621 do CPP e reproduzidas no art. 263 do RISTF.
No âmbito da revisão criminal, é ônus processual do requerente ater-se às hipóteses taxativamente previstas em lei e demonstrar que a situação processual descrita autorizaria o juízo revisional. Essa ação não atua como ferramenta processual destinada a propiciar tão somente um novo julgamento, como se fosse instrumento de veiculação de pretensão recursal. Possui, destarte, pressupostos de cabimento próprios que não coincidem com a simples finalidade de nova avaliação do édito condenatório.
Portanto, a via da revisão criminal não deve existir para que o Tribunal Pleno funcione como simples instância recursal destinada ao reexame de compreensões das Turmas.
Nesse sentido, a análise empreendida em sede de revisão criminal cinge-se a aspectos de legalidade da condenação proferida sem lastro jurídico ou probatório, o que não corresponde à avaliação encetada em sede de apelação, em que também é possível o reexame aprofundado da suficiência dessas provas ou ainda da melhor interpretação do direito aplicado ao caso concreto.
Desse modo, a revisão criminal não é apta para equacionar controvérsias razoáveis acerca do acerto ou desacerto da valoração da prova ou do direito, resguardando-se seu cabimento, em homenagem à coisa julgada material, cuja desconstituição opera-se apenas de modo excepcional, às hipóteses taxativamente previstas no ordenamento jurídico.
Fixadas essas premissas, o Colegiado analisou que, no tocante à fixação da reprimenda imposta, a revisão criminal manejada com a finalidade de desconstituir parcela da dosimetria da pena não permite a reconstrução da discricionariedade atribuída ao órgão jurisdicional naturalmente competente para essa análise.
Sob esse enfoque, a revisão criminal não se presta ao escrutínio da motivada avaliação por parte do órgão competente acerca da exasperação da pena-base.
Além disso, no que se refere à suposta incidência da minorante do arrependimento posterior (CP, art. 16), o delito em questão é de natureza formal, e prescinde da ocorrência de resultado naturalístico. Não obstante, o decreto condenatório esclarece que o ato que configuraria o alegado arrependimento é de autoria de terceiro, e não do interessado. Assim, como esse ato exige pessoalidade e voluntariedade na reparação implementada para que se aperfeiçoe, ele não ocorreu.
Vencidos os ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Marco Aurélio, que conheceram da revisão criminal e a julgaram procedente para reduzir a pena imposta. Vencido também o ministro Dias Toffoli, que se limitou a conhecer do pedido”.
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Livro: Código de Processo Penal e Lei de Execução Penal Comentados por Artigos