De acordo com o disposto no art. 65 da Lei nº 7.210/84, “A execução penal competirá ao Juiz indicado na lei local de organização judiciária e, na sua ausência, ao da sentença”. O dispositivo confirma a natureza jurisdicional do processo de execução, etiquetando o juízo da execução como um dos seus órgãos.
A competência do juiz da execução se inicia, em regra, com a possibilidade de que se execute a pena, seja pelo trânsito em julgado da sentença condenatória, seja pelo cumprimento das condições estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal para a execução provisória da pena. É também possível aplicar as disposições da Lei de Execução Penal para conceder benefícios nas situações em que o agente está preso preventivamente e, condenado em primeira instância, aguarda o julgamento do recurso. Neste caso, todavia, é o próprio juiz da condenação quem decide, pois ainda não há processo de execução formado.
Quanto ao local competente para a execução, a orientação firmada pela Terceira Seção do STJ é no sentido de que a competência se firma, em regra, de acordo com as leis de organização judiciária do juízo da condenação:
“(…) A jurisprudência desta Corte, com fundamento no art. 65 da Lei de Execuções Penais, firmou entendimento de que o juízo competente para a execução penal é o indicado na lei local de organização judiciária do Juízo da condenação. É evidente que o fato de o processo executivo ser de competência de juízo que não corresponda ao do domicílio do réu não impede, por si só, que a pena possa ser cumprida neste último local, sob a supervisão de juízo que deve ser deprecado para essa finalidade. 3. A despeito de otimizar a ressocialização do preso e de humanizar o cumprimento da reprimenda, pela maior proximidade do preso aos seus familiares, a transferência de presídio depende da existência de vaga. 4. Agravo regimental não provido” (AgRg no CC 143.256/RO, j. 08/06/2016).
No entanto, há circunstâncias que podem modificar essa competência, como no caso em que o sentenciado está preso em local diverso daquele em que houve a condenação. Mesmo que haja várias execuções a cumprir, todas serão reunidas na comarca onde ele estiver preso. Caso seja transferido, o rol de execuções o acompanha:
“Situação em que a posição de liderança e a influência do apenado na organização criminosa conhecida como “Comando Vermelho – CV” aliadas à facilidade de comunicação com a organização criminosa acaso permanecesse recolhido num presídio do Estado do Rio de Janeiro recomendam a manutenção da segregação do apenado em presídio federal de segurança máxima, reconhecendo-se a competência do Juízo Federal da Vara de Execução Penal de Catanduvas – SJ⁄PR, ora suscitado, para prosseguir na execução da pena” (AgRg no CC 150.364/RJ, j. 22/02/2017).
A situação acima, aliás, reflete o cumprimento do disposto no art. 6º da Lei nº 11.671/08.
Outra situação em que a competência se modifica é aquela em que o agente foi condenado pela Justiça Federal, Militar ou Eleitoral, mas a pena é cumprida em estabelecimento sujeito a administração estadual. Neste caso, como dispõe a súmula nº 192 do STJCompete ao juízo das execuções penais do estado a execução das penas impostas a sentenciados pela justiça federal, militar ou eleitoral, quando recolhidos a estabelecimentos sujeitos à administração estadual., a execução da pena compete ao juízo de execução penal do Estado.
A regra a respeito da competência do juízo da condenação vem sendo aplicada inclusive na execução de penas restritivas de direitos. O STJ firmou a tese de que a transferência de domicílio do condenado não provoca a alteração da competência, razão por que o juízo competente para a execução apenas expede carta precatória para que a fiscalização do cumprimento seja feita no local em que o condenado reside:
“Quanto à execução de penas restritivas de direitos, “esta Corte possui entendimento firmado no sentido de que a competência para a execução penal cabe ao Juízo da condenação, sendo deprecada ao Juízo do domicílio do apenado somente a supervisão e acompanhamento do cumprimento da pena determinada, inexistindo deslocamento de competência” (CC 113.112⁄SC, Rel. Ministro GILSON DIPP)” (CC 137.889/PR, j. 11/03/2015).
O mesmo se aplica para o cumprimento da pena em regime aberto: caso o condenado mude seu endereço, a pena pode ser cumprida em Casa do Albergado localizada no local do respectivo endereço, mas àquele juízo cabe apenas a fiscalização; a execução permanece no juízo da condenação:
“Esta Corte possui entendimento firmado no sentido de que ao Juízo da condenação compete a execução da pena, não havendo deslocamento desta competência pela mudança voluntária de domicílio do condenado à pena em regime aberto, devendo ser deprecada ao Juízo do domicílio do apenado a supervisão e acompanhamento do cumprimento da reprimenda determinada” (CC 131.468/RS, j. 26/02/2014).
É possível também que seja necessária a execução forçada da pena de multa.
Aplicada nos moldes do art. 49 do Código PenalArt. 49 - A pena de multa consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada em dias-multa. Será, no mínimo, de 10 (dez) e, no máximo, de 360 (trezentos e sessenta) dias-multa. § 1º - O valor do dia-multa será fixado pelo juiz não podendo ser inferior a um trigésimo do maior salário mínimo mensal vigente ao tempo do fato, nem superior a 5 (cinco) vezes esse salário. § 2º - O valor da multa será atualizado, quando da execução, pelos índices de correção monetária. , a multa deve ser paga no prazo de dez dias após a extração de certidão da sentença condenatória (art. 164 da Lei de Execução Penal)Art. 164. Extraída certidão da sentença condenatória com trânsito em julgado, que valerá como título executivo judicial, o Ministério Público requererá, em autos apartados, a citação do condenado para, no prazo de 10 (dez) dias, pagar o valor da multa ou nomear bens à penhora. § 1º Decorrido o prazo sem o pagamento da multa, ou o depósito da respectiva importância, proceder-se-á à penhora de tantos bens quantos bastem para garantir a execução. § 2º A nomeação de bens à penhora e a posterior execução seguirão o que dispuser a lei processual civil.. (Note-se que o dispositivo legal menciona expressamente o trânsito em julgado da sentença condenatória como condição para a extração da certidão. Acreditamos, no entanto, que, cumpridos os requisitos para a execução provisória da pena, nada impede a extração da certidão juntamente com o início da pena privativa de liberdade. Afinal, parece-nos incoerente – e mesmo desproporcional – admitir a execução imediata da pena de prisão – a consequência mais grave imposta em decorrência de uma prática criminosa – ao mesmo tempo em que se toma o cuidado de aguardar o trânsito em julgado da sentença condenatória para executar medida que pode produzir apenas efeitos patrimoniais. Mas não podemos ignorar que, por disposição semelhante no art. 147 da LEP, o STJ tem decidido (RHC 83.406/RS, j. 23/06/2017) que a pena restritiva de direitos não pode ser provisoriamente executada, entendimento que em tese pode ser estendido para obstar a execução da pena de multa nas mesmas circunstâncias.)
Pois bem. Uma vez que a multa não tenha sido paga pelo condenado no prazo de dez dias, sua exigência não compete ao juízo da execução, como ocorria antes. Após extenso debate, firmou-se a orientação de que em virtude da natureza de dívida de valor – embora mantenha o caráter penal – a multa deve ser executada pela Fazenda Pública, de acordo com as regras da execução fiscal (súmula nº 521 do STJ).
Caso o sentenciado tenha foro por prerrogativa de função, a execução será da competência do próprio tribunal perante o qual foi processado e julgado. É o que ocorre, por exemplo, com os condenados da Ação Penal 470, em relação aos quais o STF apenas delega a fiscalização do cumprimento da pena, mas mantém as decisões sobre a concessão de benefícios típicos da execução, como aliás ocorreu recentemente, em que uma das rés foi beneficiada pelo livramento condicional.
E nos casos de medida de segurança tem-se considerado que o juízo competente para a execução é o do local do cumprimento. E há decisão do STJ atribuindo a competência com base na residência do agente para a execução da medida de segurança consistente em tratamento ambulatorial (CC 39.059/SP, j. 28/09/2005).
Destacamos, por fim, que o art. 387, § 2º, do CPP dispõe que “O tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade”.
Trata-se de aplicar o instituto da detração no momento em que se estabelece o regime de cumprimento da pena na sentença condenatória. O legislador, desse modo, antecipou a análise da detração para o momento da sentença, mais especificamente para fins de fixação do regime inicial de cumprimento da pena. De acordo com a nova sistemática, deve o magistrado proceder à aplicação da reprimenda normalmente, seguindo o disposto no artigo 68 do Código Penal. Obtida a pena apropriada, na determinação do regime inicial deve ser observado o tempo de prisão processual. Não se trata, pois, de considerar a detração na aplicação da pena (etapa já encerrada), mas tão somente, como expressa o texto legal, de admiti-la para estabelecer um regime inicial justo diante da constrição da liberdade anterior ao trânsito em julgado.
Se por acaso o juiz da condenação não proceder à detração, compete ao juiz da execução tomar imediatamente a providência para contornar a omissão contida na sentença. Segundo o STJ, não é necessário cumprir nenhum requisito típico da progressão de regime, pois a detração não se confunde com o benefício da execução penal; basta que se faça incidir o tempo de prisão anterior à sentença:
“(…) O art. 387, § 2º, do Código de Processo Penal, refere-se ao regime inicial de cumprimento de pena e não possui relação com o instituto da progressão de regime, própria da execução penal, devendo o juiz sentenciante verificar, no momento da prolação da sentença, a possibilidade de se fixar um regime mais brando em razão da detração, não havendo que se falar em análise dos requisitos objetivos e subjetivos, mas tão somente no tempo de prisão provisória naquele processo. 8. Noticiado o trânsito em julgado da condenação, cabe ao Juízo das execuções verificar a possibilidade de fixação de regime de cumprimento da pena em regime mais brando, consoante os termos do art. 387, § 2º, do CPP. Precedentes” (HC 395.325/SP, j. 18/05/2017).
A nosso ver, porém, a detração, nessa fase, só é capaz de permitir regime prisional menos rigoroso se o tempo de prisão provisória, administrativa ou de internação coincidir com o requisito temporal da progressão, sem desconsiderar outros requisitos objetivos inerentes ao incidente (como a reparação do dano nos crimes contra a Administração Pública). A solução adotada pelo STJ é campo fértil para injustiças. Imaginemos que “A” seja condenado a oito anos e quatro meses de reclusão depois de ter respondido ao processo preso por seis meses. Aplicada pura e simplesmente a detração, “A” iniciará o cumprimento da pena em regime semiaberto após ter permanecido preso por apenas seis meses. No entanto, outro condenado a pena semelhante, mas que não tenha respondido ao processo preso, deverá ser recolhido para iniciar o cumprimento da pena em regime fechado, no qual permanecerá por pelo menos um ano e quatro meses.
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Curso: Intensivo para o Ministério Público e Magistratura Estaduais + Legislação Penal Especial
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Livro: Código de Processo Penal e Lei de Execução Penal Comentados por Artigos (2017)