Informativo: 915 do STF – Direito Penal
Resumo: Como não possuem a substância psicoativa própria da droga, as sementes de maconha não podem ser consideradas matéria-prima ou insumo para a produção. É atípica a conduta de importar pequena quantidade de sementes de maconha para uso próprio.
Comentários:
O crime de tráfico de drogas pode se caracterizar pela prática de numerosas condutas. No caput do art. 33 da Lei 11.343/06 são tipificadas condutas relativas às drogas propriamente ditas, ao passo que no § 1º há condutas equiparadas, ou seja, punidas com a mesma reclusão de cinco a quinze anos, dentre as quais destacamos as de importar, exportar, remeter, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, fornecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo ou guardar, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas.
Matéria-prima é a substância principal que se utiliza, ainda que eventualmente, no fabrico da droga; insumo é o elemento necessário, não necessariamente indispensável, para produzir a droga; já o produto químico é a substância resultante de uma elaboração química destinada à preparação de drogas.
As sementes de maconha se adequam a uma dessas definições?
Como bem anota Vicente Greco Filho a respeito do que se entende por matéria-prima para a produção de drogas, “Não há necessidade de que as matérias-primas tenham já de per si os efeitos farmacológicos dos tóxicos a serem produzidos; basta que tenham as condições e qualidades químicas necessárias para, mediante transformação, adição etc., resultarem em entorpecentes ou drogas análogas. São matérias-primas o éter e a acetona, conforme orientação do Supremo Tribunal Federal e consagração da Convenção de Viena de 1988” (Lei de Drogas Anotada – Lei 11.343/2006. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 96).
No que tange às sementes de maconha, o fato de que delas não seja possível extrair o tetrahidrocanabinol no geral não tem sido considerado para estabelecer a atipicidade de condutas relativas à importação. O STJ tem diversos julgados a este respeito:
5ª Turma: “Malgrado não se possa extrair a substância tetrahidrocannabinol (THC) diretamente das sementes de cannabis sativa lineu, a sua germinação constitui etapa inicial do crescimento da planta e, portanto, trata-se de matéria-prima destinada à produção de substância cuja importação é proscrita, caracterizando a prática do crime de tráfico de drogas, conforme a dicção do art. 33, § 1º, I, da Lei n. 11.343/2006. Precedentes” (RHC 77.554/SP, DJe 19/12/2016).
6ª Turma: “O fruto da planta cannabis sativa lineu, conquanto não apresente a substância tetrahidrocannabinol (THC), destina-se à produção da planta, e esta à substância entorpecente, e sua importação clandestina amolda-se ao tipo penal insculpido no artigo 33, § 1º, da Lei n. 11.343/2006 sem que se possa falar em interpretação extensiva ou analogia in malam partem, tampouco em desclassificação para o delito de contrabando, dada a especialidade da norma que criminaliza a importação de matéria prima para a preparação de substância entorpecente” (AgRg no REsp 1.609.752/SP, DJe 01/09/2016).
É certo que a 6ª Turma do STJ tem decisões nas quais considerou atípica a importação de sementes de maconha, mas o principal motivo foi a pequena quantidade de sementes importadas para uso próprio, que, segundo tais decisões, descaracteriza o tráfico e, ao mesmo tempo, não tem correspondência no art. 28 da Lei 11.343/06 (AgRg no AgInt no REsp 1.616.707/CE, j. 26/06/2018).
Recentemente, no entanto, o STF concedeu, por maioria, habeas corpus (141.161 e 142.987) por considerar atípica a importação de sementes de maconha porque, dentre outras razões, não se pode tê-las por matéria-prima para a produção de droga. Segundo o ministro Edson Fachin, “A matéria-prima e o insumo devem ter condições e qualidades químicas para, mediante transformação ou adição, produzir a droga ilícita, o que não é o caso, uma vez que as sementes não possuem a substância psicoativa”.
O ministro Gilmar Mendes, por sua vez, fez referência à mesma tese aventada pelo STJ, de que a importação de pequena quantidade de sementes de maconha para uso próprio deveria se subsumir ao art. 28 da Lei 11.343/06. Não havendo indícios de que os importadores tinham o hábito de importar sementes para tráfico, e considerando as particularidades dos casos concretos, sobretudo a reduzida quantidade de sementes apreendidas, julgou atípica a conduta.
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