No final do mês passado, o STJ publicou dois novos enunciados na súmula de sua jurisprudência, cimentando entendimentos que já estavam incorporados na Corte Superior.
Quem já vinha acompanhando as minhas aulas nos cursos do CERS, seguramente, não terá qualquer dificuldade de compreensão, pois os temas já vinham sendo, verticalmente, abordados por mim.
Na forma regimental, os dois novos enunciados estão ganhando publicidade, para orientar a prática jurídica, parametrizando as decisões vindouras. Em razão da teoria dos precedentes, abraçada pelo novo CPC, os juristas precisam dedicar atenção e cuidado no trato da matéria.
Sobreleva parar um pouco e dar atenção!
O Enunciado 618 da súmula de jurisprudência do STJ versa sobre a proteção do meio ambiente, vazado em termos precisos: “a inversão do ônus da prova aplica-se às ações de degradação ambiental.” Nenhuma novidade, malgrado de grande relevância prática. Em verdade, o CPC15, no comando do Par. 1º do seu art. 373, já consagra a teoria da carga dinâmica do processo, conferindo mobilidade ao processo, com justiça social. De acordo com a teoria, coerentemente, o juiz pode (re)distribuir o ônus de prova em conformidade com a capacidade de produção da prova.
É o exemplo de uma ação de alimentos, na qual, muita vez, o credor (autor da ação) não tem condições de demonstrar a capacidade contributiva do devedor. Assim, pode o magistrado determinar ao réu a produção de determinadas provas, que estão ao seu alcance. Também é o exemplo das ações ambientais, nas quais, não raro, o réu (que está sendo acusado, por exemplo, de poluição) tem melhores condições de apresentar certas provas. Sem a inversão, com frequência, o caminho inexorável será a improcedência do pedido, na medida em que o autor pode ter, em casos específicos, muita dificuldade em comprovar a autoria do dano ambiental.
O entendimento sumulado, portanto, apenas explicita um permissivo que decorre do texto expresso do Diploma Processual.
Com igual natureza de tabelião da prática já vigente, o Enunciado 619 da súmula da jurisprudência do STJ confirma que invasor de terras públicas não tem posse, mas mera detenção: “a ocupação indevida de bem público configura mera detenção, de natureza precária, insuscetível de retenção ou indenização por acessões e benfeitorias”.
Nada de novo. O STJ já reconhecia, de há muito, que a invasão de áreas públicas não caracteriza posse, mas mera detenção, como um fato objetivo. Com isso, não decorrem os efeitos da posse, privando o invasor do direito de indenização ou retenção por benfeitorias e acessões (mesmo estando de boa-fé) e da possibilidade usucaptiva (STJ, REsp. 1.129.480/GO, rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva). Enfim, quem invade terra pública não pode obter efeitos jurídicos em relação ao Poder Público.
Tenho reticências em relação ao tema. Penso que o Poder Público não pode estar imune ao cumprimento da função social da propriedade, constitucionalmente imposta (CF, art. 5º, XXII e XXIII). Se um bem público não cumpre a função social há de se verificar o caso, protegendo, se for o caso, quem garantiu a destinação social. Nesse caso, poder-se-ia, inclusive, prospectar a possibilidade de caracterização de improbidade administrativa pelo gestor público desidioso, negligente, que deixou de destinar adequadamente o bem do Estado. Já há precedentes em tribunais diversos admitindo essa tese que já abordo em nosso CURSO DE DIREITO CIVIL: Reais (vol.5) , desde a primeira edição.
Chamo a atenção, todavia, para uma relevante advertência: o invasor de área pública não é considerado possuidor em relação ao Poder Público. Mas, é considerado possuidor e merece proteção contra terceiros. Por isso, se o invasor vier a ser esbulhado terá direito à proteção possessória contra o terceiro, afinal de contas é detentor em relação ao Estado. Nessa ordem de ideias, os interditos possessórios podem ser manejados entre particulares, ainda que a posse esteja relacionada a terras públicas. A jurisprudência sempre foi favorável a este posicionamento (STJ, REsp 1.484.304/DF, rel. Min. Moura Ribeiro).
Nota-se, assim, que os novos enunciados da súmula de jurisprudência do STJ são muito mais declarativos do que constitutivos. Afirmam o que já se sabia! Tudo como dantes… Antevejo, contudo, um ponto relevante: explicita um entendimento jurisprudencial, dando conhecimento à comunidade, estimulando a unificação das decisões e estimulando, com isso, mais segurança justiça e menos recursos.
Como já percebia CAZUZA, o tempo não para…